Com um novo ano já em marcha, o Algarve Informativo foi até ao Teatro Lethes, em Faro, para conversar com Luís Vicente, diretor da ACTA – A Companhia de Teatro do Algarve. Na génese do encontro esteve a apresentação da programação para 2016 da mítica sala de espetáculos da capital algarvia, mas o tête-à-tête depressa extrapolou para a análise do panorama cultural nacional e regional com um dos atores e encenadores mais prestigiados da língua de Camões. E assim ficamos a conhecer um pouco melhor as dores de cabeça do que é gerir uma companhia teatral num país onde a crise é a eterna desculpa para cortar no financiamento da Cultura, logo ela que é, imagine-se, uma das atividades que mais Valor Acrescentado Bruto gera para Portugal.

Entrevista: Daniel Pina

A nova geração provavelmente não pula de excitação ao ouvir falar de Luís Vicente, mas quem anda na faixa dos 40 anos não esquece aquele que foi provavelmente um dos primeiros vilões da televisão portuguesa, o célebre Átila da série «Duarte & Companhia», transmitida pela RTP na década de 80. O papel catapultou o ator e encenador para o estrelato, sucederam-se muitos outros e, com o intuito de escapar um pouco a todo esse frenesim e ao corre-corre típico de Lisboa, o setubalense aceitou o convite dos fundadores da ACTA – A Companhia de Teatro do Algarve, em meados de 1997, para colocar a entidade em funcionamento. Uma missão que, na sua cabeça, lhe tomaria dois anos, ou seja, seriam umas férias perfeitas da televisão a trabalhar na periferia, mas foi-se envolvendo cada vez mais no projeto e, de repente, está no Algarve há 18 anos. “Não existia nenhuma estrutura profissional de teatro no Algarve, nem de música ou de dança, falei com o Ministro da Cultura da época, o Manuel Maria Carrilho, e ele disse que fazia todo o sentido avançar com a ACTA para a frente. Havia um potencial interessante e pessoas que tinham a consciência dessa carência e cinco autarquias associaram-se de imediato ao projeto e garantiram parte significativa do financiamento para se arrancar”, recorda o entrevistado.
Havia potencial mas, na hora da verdade, não existiam recursos humanos com a necessária formação específica para o teatro, e não falamos apenas de atores e encenadores, mas de todo o pessoal que trabalha atrás da cortina, nos bastidores. “Isto é um bocado como a botânica: temos as plantas fanerogâmicas, que dão flor, e as criptogâmicas, que não dão flor. As que dão flor são, por relação, os artistas, o lado visível da coisa, mas uma estrutura destas exige uma retaguarda muito forte e sólida. A gestão de uma companhia de teatro parece muito fácil, mas é algo bastante complicado”, avisa Luís Vicente, lembrando-se bem de uma década em que o país estava a mudar a um ritmo intenso. “A ideia do Manuel Maria Carrilho era haver pelo menos um grande equipamento cultural por distrito e isso ele conseguiu. No entanto, depois dos edifícios construídos, é preciso colocá-los a funcionar e as pessoas não estavam preparadas para o problema que isso é. Uma programação custa muito dinheiro, assim como ter um teatro de porta aberta, e as coisas têm resultado no Teatro Lethes graças a uma excelente equipa de voluntários. Quando avancei com esta ideia, bolas, houve quem me caísse em cima, porque não estava a criar postos de trabalho e andava a explorar as pessoas. Hoje, temos 31 voluntários, maioritariamente do sexo feminino, sendo que a mais nova tem 12 anos e a mais velha tem 70”, descreve.