Nos dias 23 e 24 de novembro, o Cine-Teatro Louletano voltou a abrir as portas aos alunos do concelho, desta vez por ocasião da peça «Este Não Sou Eu», criado por Lita Pedreira, Luís Geraldo e Vera Alvelos com o intuito de dar a conhecer o poeta António Aleixo. Homem bem conhecido das gentes de Loulé, Aleixo colocou na sua escrita todo o desassossego, sensibilidade e agudeza com que via as coisas num período bastante difícil para os portugueses, com a música sempre a acompanhar as ideias das suas palavras e que agora são transmitidas, de uma forma mais suave e alegre, às novas gerações.

Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

Já se tornou um hábito o Cine-Teatro Louletano receber, durante o horário escolar, diversas turmas de jovens alunos do concelho, numa política ativa de criar públicos culturais desde tenra idade e de sensibilizar as novas gerações para importantes questões da atualidade. Isso mesmo voltou a acontecer, nos dias 23 e 24 de novembro, com a peça «Este não sou eu», que pretende ser uma viagem pelas palavras e lugares de António Aleixo, homem, poeta e feroz crítico social.
Com o palco do Cine-Teatro a fazer lembrar uma antiga taberna, em cujas mesas estavam sentados os pequenotes, o objetivo deste projeto de Lita Pedreira, Luís Geraldo e Vera Alvelos, com texto de Maria Quintans, é que os mais novos se consigam identificar com a poesia de António Aleixo, poeta nascido em Vila Real de Santo António que bem cedo se mudou para Loulé e que sempre foi um homem de várias rimas, nos melhores e nos piores momentos da sua vida. Em palco encontram-se dois atores – Lita Pedreira e Luís Geraldo – simbolizando as muitas personalidades do poeta, que procuram transmitir, de forma ligeira, a sua arte de escrita, certeira, influenciada pelas enormes e chocantes desigualdades sociais dos tempos em que viveu.
O espetáculo teve, na sua génese, o segmento infantojuvenil como público-alvo preferencial, mas o projeto não interessa apenas às crianças, conforme explicou a produtora executiva Joana Cordeiro minutos antes da primeira sessão. “Procura refletir a importância que a poesia tem nas nossas vidas e isso diz respeito a pessoas de todas as idades”, explica. “A Maria Quintans, sendo poeta, teve uma sensibilidade muito específica e encontrou uma dualidade, que existe também em todos nós, entre o poeta e o homem que experimenta a vida do dia-a-dia, as durezas, as agruras, as dificuldades”, acrescentou Vera Alvelos, responsável pelo espaço cénico e figurinos.
Conscientes de que a peça está alicerçada num texto difícil e duro, havia que descobrir a melhor forma de chegar aos mais jovens e encontrou-se uma dimensão bastante próxima da ideia de poesia, com muita simbologia e expressão, e outra mais próxima do público, em que a história de António Aleixo é contada a poucos passos das crianças e num tom mais coloquial, por vezes até mais alegre. “É um jogo de dualidade também entre, por um lado, a idealização da vida, a imaginação e a criatividade e, por outro, a realidade. Penso que conseguimos encontrar estes vários planos através da linguagem teatral e cénica e da interpretação dos dois atores. Estivemos em Lisboa, numa residência artística de três semanas, a trabalhar com o texto e com os vários objetos que fomos encontrando e que pretendíamos que fossem o mais reais possíveis, para transmitir esta ideia de história, de veracidade”, sublinha Vera Alvelos.
Em palco encontram-se, então, duas turmas, numa espécie de taberna construída para o propósito, com os alunos a tornarem-se intervenientes na própria peça, desafiados por Lita Pedreira e Luís Geraldo a lerem alguns poemas de António Aleixo, mas também a brindarem à memória dos já partidos. E, para criar todo este ambiente intimista e acolhedor, muito contribuíram Valter Estevens, na iluminação, e Pedro Ramalho, na construção de algumas peças do cenário. Quanto a colocar as crianças em palco, ao invés de sentadas na plateia, é positivo para que se sintam cativadas pela forte história, e lições de vida, de António Aleixo. “Quisemos aproximá-las dos atores, até porque Aleixo é de Loulé, é um conterrâneo, alguém que experimentou a primeira metade do século XX, das décadas mais duras da nossa existência, com uma pobreza extrema. Apesar disso, de todas as dificuldades, manteve sempre uma atitude criativa e pretendemos fazer justiça a essa vida tão rica envolvendo mais o público”, aponta Vera Alvelos.