Pelo sexto ano consecutivo, o Projeto Inclusão pela Arte levou diversos utentes da APATRIS 21 – Associação para Portadores de Trissomia 21 do Algarve a pisar o palco do Teatro Lethes, no dia 1 de julho, num espetáculo onde se abordou o amor, os gostos e receios de cada um de nós e destas pessoas com perturbações do desenvolvimento intelectual.

Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

A noite estava quente e convidava a um passeio ao ar livre, as alternativas também eram muitas no que toca a eventos culturais, mas a plateia do Teatro Lethes estava cheia para se assistir a mais um espetáculo do Projeto Inclusão pela Arte, no dia 1 de julho. Familiares, amigos, colaboradores da associação, todos ávidos para ver o que os utentes da APRATIS 21 – Associação para Portadores de Trissomia 21 do Algarve levariam a cena nesta noite especial, mais uma vez numa encenação de Elisabete Martins, da ACTA – A Companhia de Teatro do Algarve.
A parceria entre as duas entidades traduz-se, na prática, na realização de uma aula semanal, de duas horas, de expressão dramática para crianças e jovens com perturbações do desenvolvimento intelectual de diferentes etiologias, existe desde 2011 e dá lugar, no final de cada ano letivo, se assim se pode chamar, a uma performance numa das principais salas de espetáculos do Algarve. Desta vez, mais do que um texto com princípio, meio e fim, seriam contadas histórias surgidas a partir de conversas sobre o amor, os medos, os gostos e desejos de cada um.
As coreografias não eram muito elaboradas ou fisicamente exigentes, porque alguns dos atores têm determinadas dificuldades motoras. As falas eram curtas, porque as palavras querem-se simples, sinceras, honestas. Não faltaram as músicas, os efeitos sonoros e os jogos de luz, tudo o que compõe uma normal peça de teatro. E, apesar de não estarmos na presença de atores de teatro, nem sequer dos mais amadores dos amadores, a plateia estava de respiração suspensa, a escutar atentamente tudo o que era dito e a acompanhar o «enredo».
Em palco estiveram Alice Panagopoulos, André Antunes, Carolina Palma, Carolina Vilão, Joana Ramalho, João Terremoto, Marta Flor, Mónica Flor, Pedro Mestre, Ricardo Miguel, José Vieira e Vera Revez, mas também três alunos estagiários da Escola Secundária Tomás Cabreira, designadamente Adriana Tincul, Catarina Morais e Mariana Monteiro. Ao longo da peça, muitas palmas, e lágrimas também, acreditamos, apesar das luzes apagadas não deixarem vislumbrar os rostos dos espetadores. Mas o simples facto destes jovens e adultos estarem em cima do palco, não renegando a sua «diferença», antes pelo contrário, abraçando-a, é um puro ato de coragem a que ninguém pode, nem deve, ficar indiferente.
Foi, sem dúvida, uma noite de emoções fortes e nem sequer faltou um pedido de casamento, perante o público, a uma psicóloga da APATRIS 21. Para alívio do noivo, e por entre muitas lágrimas da noiva e palmas da assistência, a resposta foi o tão desejado «Sim». Depois das cortinas fechadas, enquanto os utentes da associação conviviam com os familiares, Elisabete Martins exibia um sorriso, como que a dizer que tinha corrido tudo bem. “A APATRIS entrou em contato com a ACTA para se levar este projeto por adiante e eu sempre gostei de trabalhar competências nesta vertente mais social, mas não sabia onde me ia meter”, recorda a atriz e encenadora, reconhecendo que não é fácil trabalhar com este género de «atores». “Ao fim de seis anos já estão habituados a tudo o que envolve estar em palco, mas o primeiro ano foi caótico. Nunca tive formação específica nesta área, aprendi a trabalhar de perto com as técnicas da associação, com as psicólogas e terapeutas da fala e de motricidade. O mais importante de tudo é criar rotinas e manter as coisas simples”.