Está a decorrer o período de votação das propostas da primeira edição do Orçamento Participativo de Portugal, ao mesmo tempo que vão sendo também conhecidos os vencedores dos Orçamentos Participativos de diversos municípios algarvios. Entretanto, os Orçamentos Participativos já chegaram também a mais de 600 escolas do terceiro ciclo, demonstrando que esta ferramenta não é uma mera moda, mas sim um excelente meio de promover a cidadania ativa e de envolver as pessoas na tomada de decisões de nível local, regional e nacional.

Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

Nelson Dias tem trabalhado de perto com os Orçamentos Participativos praticamente desde que eles foram implementados em Portugal, há cerca de 15 anos, verificando que o processo tem vindo a crescer de forma mais significativa neste último mandato autárquico (2013-2017). “Disparou, completamente, em termos numéricos e de abrangência territorial, mas ainda são processos frágeis. Estando Portugal em período eleitoral, há que aguardar para perceber qual vai ser a intenção dos novos eleitos, porque tudo isto depende da vontade política de cada autarca. De qualquer modo, o nível de consistência que se alcançou ao longo destes últimos quatro anos é bastante positivo, ao ponto de, em alguns concelhos, ser já muito difícil a quem for eleito cancelar o processo”, analisa o consultor e antigo presidente da Associação In Loco.
Recorde-se que, de 2001 a 2009, os Orçamentos Participativos (OP) eram essencialmente consultivos, ou seja, não era dado poder efetivo de decisão aos cidadãos, e estes rapidamente demonstraram a sua não concordância com o modelo. “Não criava confiança junto das pessoas, era mais do mesmo, portanto, não participavam. Percebeu-se que os processos deliberativos, sim, eram sustentáveis, daí que, no mandato de 2009 a 2013, a maior parte dos OP mudasse de figurino e os resultados não se fizeram esperar. Os autarcas compreenderam que precisavam adotar uma nova forma de governação, mais próxima dos cidadãos, para conseguir ganhar a sua confiança”, refere o entrevistado, lembrando os elevados indicadores de desconfiança existentes em Portugal. “As pessoas, hoje, querem sobretudo software, e não apenas hardware, obras de betão. E querem fazer parte da solução, querem ter voz, querem dar a sua opinião, umas vezes mais positiva, outras mais negativa. Mesmo aqueles cujos projetos não saem vencedores dos OP reconhecem que é uma boa ferramenta, até fundamental para reconstruir a confiança no poder político”, salienta.
Nelson Dias avisa, contudo, que os OP, por si só, não fazem milagres, devendo estar inseridos num conjunto de políticas e numa forma diferente de governar. E não foi fácil, no início, para os autarcas abrirem mão de parte do seu poder e de uma parcela do orçamento dos seus municípios, recorda. “Tinham os seus programas eleitorais para executar, muitos deles inflacionados e impossíveis de cumprir. Pelo meio tivemos toda a crise financeira e das finanças públicas, que dificultou ainda mais a concretização de programas que eram inflacionados. Havia muito receio por parte dos eleitos que esse dinheiro pudesse ser tomado por grupos de interesses, que também existem e fazem o seu trabalho quando não existem OP. Nos OP, as pessoas estão a tentar resolver problemas dos seus bairros, freguesias ou concelhos, são interesses saudáveis, transparentes e públicos”, entende.