A Orquestra de Jazz do Algarve iniciou 2016 com dois concertos de Ano Novo em Lagoa e Lagos, naquela que promete ser uma agenda bastante preenchida de atuações um pouco por toda a região. Com residência no concelho de Lagoa e repertórios para todas as ocasiões e públicos, o grupo fundado e liderado pelo conceituado trompetista Hugo Alves é uma das principais referências do panorama cultural algarvio, numa altura em que, infelizmente, a diferença entre conjuntos profissionais e agrupamentos amadores nem sempre é percetível pelos portugueses e, pior do que isso, pelos organizadores de eventos e programadores culturais.

Entrevista: Daniel Pina

Depois dos concertos dos dias 23 e 30 de janeiro, respetivamente em Lagos e Lagoa, Hugo Alves prepara-se para mais um ano de grande atividade à frente da Orquestra de Jazz do Algarve, com a satisfação de 2015 ter sido um ano bastante positivo, mas com a forte convicção de que projetos desta natureza precisam de ser apoiados e acarinhados pelas instâncias superiores, nomeadamente pelas entidades que gerem a cultura nacional. No caso deste projeto em concreto, o trompetista e maestro garante que é viável muito graças à residência artística concedida pela Câmara Municipal de Lagoa, o que lhe permite ter uma raiz sólida para prosseguir os objetivos e estratégias definidos. “O Município de Lagoa apoia-nos com uma estrutura logística e financeira e isso permite que possamos trabalhar todos os dias para desenvolver os vários repertórios. Depois, temos apoios a nível central, nomeadamente do Ministério da Cultura”, indica, em início de conversa.
Recuando ao passado, Hugo Alves lembra-se de uma época em que a hotelaria algarvia dava primazia a ter grupos musicais residentes, desde quartetos e quintetos a verdadeiras orquestras de cariz profissional, um cenário que, como se sabe, foi-se alterando drasticamente à medida que os anos foram avançando. Em 2004, o lacobrigense estava a produzir um festival de jazz na sua cidade natal, evento que englobava workshops de onde saíram, por assim dizer, a primeira fornada de elementos da Orquestra de Jazz do Algarve. “A Autarquia de Lagos achou a ideia bastante interessante e apoiou a fundação da orquestra. Ainda hoje, um dos nossos grandes pilares é a formação. Aceitamos praticamente qualquer músico que tenha condições mínimas de execução e, a partir daí, vão crescendo nos ensaios e nas ações educativas que desenvolvemos regularmente”, atesta o entrevistado.
Uma partilha de experiências em ambiente real entre elementos que são profissionais na verdadeira aceção da palavra, ou seja, que vivem somente da música, e outros que têm uma qualidade irrepreensível mas não são músicos a tempo inteiro. A situação não causou, no entanto, entraves à criação de uma orquestra que nunca pretendeu ser sinfónica, tendo-se vocacionado, desde o arranque, para a vertente do jazz. “São estruturas completamente diferentes e sempre trabalhei na área do jazz, o que não quer dizer que, pontualmente, não seja convidado para ser solista em programas de George Gershwin ou coisas semelhantes. No início do século XX houve alguns pontos em que a música dita clássica se cruzou ligeiramente com o jazz, mas são corridas distintas”, enfatiza Hugo Alves, que tem diversos discos gravados a solo e com outras bandas.
Mais séria fica a conversa quando se aborda o tema dos apoios, com Hugo Alves a destacar prontamente a qualidade da equipa que dirige a Orquestra de Jazz do Algarve e do trabalho por ela realizado. Apesar disso, lamenta que nem todas as autarquias da região estejam ao lado deste projeto, quando apenas existem duas orquestras em Portugal que são apoiadas pelo poder central. “Nós somos uma delas, o que quer dizer alguma coisa. Para além disso, somos um excelente cartão-de-visita para apresentar aos turistas que nos visitam, normalmente ficam surpreendidos por encontrarem uma orquestra desta natureza no Algarve. Por vezes, em três ou quatro concertos que damos no mesmo mês, apresentamos três ou quatro repertórios diferentes e com solistas ou cantores convidados. Penso que as pessoas da cultura que estão nas câmaras municipais deviam olhar um bocadinho mais para aquilo que fazem os profissionais desta terra, porque deslocar estruturas destas de fora da região é sempre muito caro”, lamenta, sem esconder algum descontentamento.