Filipe da Palma tem percorrido o Algarve de lés-a-lés nos últimos anos para registar em fotografia testemunhos das riquezas arquitetónicas de uma época anterior ao boom do turismo de massas, que deitou por terra muita da história da região para dar lugar a empreendimentos turísticos e blocos de betão. Especializado em platibandas, o fotógrafo tem um olhar clínico sobre o que é tradicional, o que faz parte da traça genuína algarvia, que depois partilha com os outros através das suas exposições.
 
Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

Foi na sessão inaugural do ciclo «Obra Aberta», que aconteceu no dia 21 de junho, na Biblioteca Municipal de Albufeira, que estivemos à conversa com Filipe da Palma. O portimonense de 45 anos, fotógrafo de profissão, ia participar numa tertúlia literária com a escritora Lídia Jorge mas, antes disso, houve oportunidade para se dar a conhecer um pouco melhor ao «Algarve Informativo», revelando que a paixão pela fotografia apareceu por volta dos 16/17 anos, durante o ensino secundário.
Como no Algarve não existia nenhuma escola para se tirar um curso especializado, mudou-se para Lisboa, frequentou o ArCo – Centro de Arte e Comunicação Visual e entrou ao serviço de um grupo editorial que possuía diversas revistas, ou seja, estava a fazer aquilo que gostava. “Sempre me fascinou o ato da tomada da imagem e, depois, estar com a imagem impressa na mão. Era um processo que implicava bastante trabalho no laboratório a preto e branco até se conseguir uma fotografia boa”, recorda, considerando que fotografar e imprimir são duas artes bem distintas. Uma distinção só possível de fazer porque Filipe da Palma ainda faz parte da geração da fotografia analógica, do velhinho rolo fotográfico, da sala escura com a luz vermelha, mas não é um saudosista, antes pelo contrário, aderiu rapidamente ao digital e às novas ferramentas desta profissão.
O nascimento do primeiro filho acabou por motivar o regresso às origens, ao Algarve, diriam alguns que foi um passo atrás em termos profissionais, mas a família estava em primeiro lugar. “Vida de estudante em Lisboa é uma coisa, para se criar uma família, a história é completamente diferente, a não ser que tenhas excelentes condições, o que não era o meu caso. Por isso, vim para baixo e deu-se uma redescoberta do Algarve”, conta, um género de epifania em que teve papel preponderante um livro de Jacinto Palma Dias – «O Algarve Revisitado». “Comecei compulsivamente a fotografar os sinais ainda tangíveis, pulsantes, de um Algarve que ainda fez parte da minha infância, mas que estava a desaparecer rapidamente. O Algarve era uma região diferente de todas as outras mas, com o passar do tempo, vai ficando igual a tudo o resto”, desabafa.
Não são, assim, as paisagens algarvias sobejamente conhecidas dos turistas por via dos postais e das revistas que encantam Filipe da Palma, que o fazem parar e sacar de repente da sua objetiva. “O turista tradicional do Algarve conhece essencialmente a praia. Aliás, se fizermos uma pesquisa na rede com o termo «Algarve», só aparecem imagens de praias. Isso para mim não significa nada, o Algarve que me interessa está acima da EN 125, da Via do Infante”, confirma, triste por constatar que esse «Algarve» está cada vez mais abandonado, deixado à sua sorte, por não estar no mediático litoral, junto à costa, nos grandes centros urbanos. 
Testemunhos fotográficos que vão ganhando quantidade consoante a disponibilidade, pois estas buscas implicam coordenar a atividade profissional com o tempo dedicado à família, mas também estão dependentes de existirem condições climatéricas propícias para o ato de captar a imagem. “Fotografar exige sempre um céu imaculadamente azul para que os elementos, principalmente os arquitetónicos, consigam saltar facilmente à vista. Tenho andado atrás de uma arquitetura que era única e que se vai tornando difícil de encontrar. Às vezes regresso a locais que visitei há uma ou duas décadas à procura de uma platibanda ou chaminé e, ou estão adulteradas, ou ruíram, ou têm uma edificação nova. No sotavento é mais fácil de encontrar precisamente porque a atividade turística se começou a desenvolver mais tarde do que no barlavento”, analisa.
Mas se a perda deste património entristece Filipe da Palma, mais preocupado fica ao verificar que muitos algarvios nem estão cientes da sua cultura, das suas raízes. “Não se reveem na sua arquitetura, nas suas cores. Se tivessem carinho e amor, tentavam manter o máximo possível desta traça”, critica, consciente que este cenário dificilmente se vai alterar, até porque boa parte das pessoas que residem no Algarve, neste momento, não são naturais da região.