A saúde mental esteve em debate no dia 9 de dezembro, no Cineteatro de São Brás de Alportel, com a tertúlia «Dignidade em Saúde Mental – Signos de Fora», promovida pela Associação de Saúde Mental do Algarve e pela Câmara Municipal de São Brás de Alportel. Um dos pontos fortes da noite foi a performance «Signos de Fora» levada a cabo pelo Teatro do Sótão, grupo inclusivo da ASMAL, do qual fomos assistir a um ensaio alguns dias antes.

Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

A poucos dias de mais uma apresentação pública, os ensaios intensificavam-se no Fórum Sócio Ocupacional de Faro da ASMAL, onde Nídia Gonçalves coordena o Teatro do Sótão, grupo de teatro inclusivo da Associação de Saúde Mental do Algarve. Desta feita, preparava-se a performance «Signos de Fora», que faria parte da tertúlia «Dignidade em Saúde Mental – Signos do Fora», a realizar no dia 9 de dezembro, no Cineteatro de São Brás de Alportel. Em palco ia-se assistir ao resultado de uma atividade semanal que envolve movimento e artes cénicas e esta Oficina de Teatro depressa deu a perceber que existia bastante interesse, disponibilidade e potencial criativo entre os utentes da ASMAL. “É um trabalho que permite uma redescoberta da própria pessoa, por lidar muito com o corpo, e pode ou não ser desenvolvido com alguma atuação em mente. Tudo depende de considerarmos que estão reunidas condições para subirmos a um palco”, explica Nídia Gonçalves.
Apresentações ao público que são importantes por uma questão de valorização e reconhecimento dos próprios elementos do grupo e para desmistificar os estigmas normalmente associados à doença mental. “São homens e mulheres que, à partida, estarão numa situação mais desfavorecida e que, através deste trabalho artístico, podem ganhar uma outra visibilidade num espaço na sociedade que é frequentado por pessoas com alguns conhecimentos e hábitos culturais”, aponta a encenadora, indicando que estes encontros semanais são pautados por muita improvisação e criação. “O processo pode começar a partir de algum poema, de um exercício de improvisação teatral, da música ou de outra expressão artística. A ideia é elaborar uma composição cénica com aquilo que realizamos, o que não significa que estejamos todas as semanas a ensaiar”, acrescenta a entrevistada.
Os atores, neste caso, são especiais, diferentes daqueles que estamos habituados a ver em cima de um palco, ou no ecrã da televisão, porque todos padecem de alguma doença mental, desde depressão a esquizofrenia. Não deve ser fácil, portanto, ensaiar uma peça nestas condições, porque nem todos estarão à vontade para interagir dentro de um grupo e, muito menos, para ter pela frente algumas dezenas ou centenas de desconhecidos numa plateia. “O que nós fazemos, sobretudo, são exercícios que permitem às pessoas olhar para si e conhecerem o seu próprio corpo, mas também fomentar a comunicação, a socialização e a sua participação na comunidade. Claro que elas também precisam estar disponíveis para isso, sozinhos não conseguimos fazer nada”, indica Nídia Gonçalves.
Ora, ao contrário do que se possa imaginar, a coordenadora do Teatro do Sótão garante que estas pessoas estão bastante recetivas para aceitar e criar coisas novas. Desse modo, quando há algum espetáculo agendado, há dois ou três ensaios semanais para afinar os pormenores. “Não é costume pegarmos num texto teatral tradicional para levarmos a cena do princípio ao fim, preferimos improvisações teatrais, poemas ou estímulos musicais. O principal é que o produto final seja um trabalho coletivo, mesmo não sendo um grupo homogéneo, por causa das diferentes patologias de que sofrem. Tentamos valorizar as singularidades de cada pessoa para criar algo que seja de todos”, sublinha, confessando que são muito inspirados pelo que acontece no momento. “O nosso trabalho está em constante mutação, é um processo contínuo, até porque faz todo o sentido incluir nele o mundo de cada elemento do grupo, os seus desejos, angústias e ambições. Uma das primeiras peças que o Teatro do Sótão fez foi uma adaptação do «Sonho de Uma Noite de Verão», do Shakespeare, mas optamos por comunicar algo mais próximo destas pessoas em concreto”.