A oitava edição dos Jogos de
Quelfes foi apresentada, oficialmente, no dia 24 de março, no Salão Nobre da
Câmara Municipal de Olhão, e são muitas as novidades deste evento que fomenta o
espírito do olimpismo junto dos mais novos e que este ano chega igualmente à
vizinha Ayamonte.
Texto: Daniel Pina |
Fotografia: Daniel Pina
Os Jogos de Quelfes são uns velhos conhecidos de Olhão,
concelho onde tudo começou, há sete anos, dando corpo a um projeto lançado em
2008. Inicialmente com a participação de apenas seis escolas, foram crescendo,
abrangeram, numa primeira fase, todo o concelho, depois, espalharam-se por
outros municípios algarvios, até chegarem, em 2017, a algumas localidades do
Alentejo e da Grande Lisboa, bem como da vizinha Ayamonte.
Muito para além de um encontro desportivo dirigido aos
alunos do 3.º e 4.º ano do primeiro ciclo do ensino básico, os Jogos de Quelfes
são uma chamada de atenção para uma filosofia de vida, o olimpismo, um
verdadeiro programa de educação para a cidadania. E o arranque dá-se com a
estafeta «Chamada para os Jogos», na escola de Marim, no dia 28 de março, que
percorrerá os vários concelhos envolvidos até à data de início do evento propriamente
dito, a 5 de maio, na cidade espanhola de Ayamonte, prolongando-se depois até
19 do mesmo mês. “Quero enaltecer os municípios que, empregando os seus
recursos, decidiram estabelecer, aqui no sudoeste da Península Ibérica, uma
nova Olimpíada, uma iniciativa preocupada com o humanismo e o perfil do ser
humano. Mas também quero agradecer a todas as juntas de freguesia, associações,
pessoas individuais, grupos de voluntários, que se empenham no sucesso dos
Jogos de Quelfes e nesta demanda que é o olimpismo”, afirmou Gustavo Marcos, da
Comissão Geral Organizadora.
O membro da Academia Olímpica de Portugal transmitiu uma
palavra especial de agradecimento aos agrupamentos de escolas envolvidos, pois
é neles que recai a tarefa de mobilizar alunos e professores para os Jogos de
Quelfes, assim como aos técnicos que andam no terreno para colocar tudo em
marcha. Logo de seguida, Gustavo Marcos deu a primeira novidade da oitava
edição, a criação da «Atlantíada», um projeto mais amplo que visa dar corpo à
demanda educativa por detrás do olimpismo. “Os jogos são direcionados aos
alunos do primeiro ciclo do ensino básico, onde não existe desporto escolar,
onde os professores, se calhar, não estão despertos para esta temática, por uma
simples razão: o cérebro de qualquer ser humano passa por um período de
desenvolvimento crucial nos primeiros 10 anos de vida, que terá uma influência
permanente nos interesses futuros da criança. Envolver os jovens em programas
de educação para a cidadania e de atividade física, que sejam divertidos,
inclusivos, educativos e estimulantes, ajuda a garantir uma experiência
positiva, aumentando a probabilidade de continuarem ativos ao longo da vida e a
integrar esses valores e ideais como património próprio”, justificou o advogado
de profissão.
Outra novidade da 8ª edição é o relançamento do manual
educativo «Kelfi e os Jogos Olímpicos», que faz parte do Plano Nacional de
Leitura em três categorias mas que estava esgotado desde 2002. “Este ano, com o
auxílio do Instituto Português do Desporto e Juventude, através do Programa
«Desporto para Todos», vamos publicar uma edição de mil exemplares, que não
terá uma distribuição comercial, sendo, sim, colocado onde mais interessa, nas
bibliotecas escolares, para que esteja próximo dos alunos e dos professores”,
revelou Gustavo Marcos, sempre salientando que o desporto deve ser encarado
como um «meio» e não como um «fim». “Quando trabalhamos com as crianças, o
nosso foco não é que todas elas se tornem atletas profissionais ou grandes
campeões. O desporto é um meio motivador e integrador que procura ser uma
correia de transmissão de valores, ativar um estado de espírito, desenvolver a
relação do aluno consigo próprio e com os demais, em suma, com tudo aquilo que
o rodeia”, destacou o «pai» dos «Jogos de Quelfes». “Num mundo onde se erguem
muros e onde se pretendem cavar diferenças, a multiculturalidade deve ser
encarada como um dos grandes valores da humanidade. São as nossas diferenças
que nos tornam mais ricos”, frisou.
O olimpismo é, contudo, uma filosofia de vida que se
pretende levar a toda a comunidade e não apenas aos mais jovens, e para tal são
importantes o «Centro de Estudos do Guadiana», como centro formador, a estafeta
«Chamada para os Jogos» e o «we move», um projeto voluntário de promoção da
prática desportiva para todos e para o olimpismo. Estafeta que envolve a
transmissão de um testemunho e que percorre as escolas dos diversos concelhos
intervenientes nos «Jogos de Quelfes», com o objetivo de difundir, junto da
comunidade escolar, a ação pedagógica da «Atlântíada» e as causas que lhe estão
associadas. A estafeta tem início, a 28 de março, em Olhão, seguindo depois para
Tavira, São Brás de Alportel, Faro, Albufeira, Loulé, Silves, Portimão,
Odivelas, Sevilha e Ayamonte, onde chegará a 5 de maio.
Desporto não é só para quem tem jeito
Em dia de apresentação de novidades, Gustavo Marcos deixou a
ambição da Estafeta «Chamada para os Jogos» chegar, até 2020, a 50 cidades de
toda a Península Ibérica e uma estrutura 100 por cento voluntária já está a
trabalhar nesse sentido. Mas o fundador dos «Jogos de Quelfes» chamou
igualmente a atenção para o projeto «we-move», avisando que as crianças de hoje
podem vir a ser a primeira geração a ter uma esperança média de vida inferior à
dos seus pais. “O desporto é para todos e não apenas para aqueles que têm
jeito, porque essa ideia pode conduzir à autoexclusão da prática desportiva, ao
sedentarismo e obesidade, a doenças crónicas, à quebra da autoestima e do
rendimento intelectual, a dificuldades de socialização, ao bullying, ao
desenvolvimento de estigmas e preconceitos e à redução do nível de felicidade.
Não é isto que queremos para as próximas gerações, portanto, não podemos ficar
parados”, defendeu. “Se queremos motivar as crianças para o desporto, temos que
as incluir a todas e, acima de tudo, encontrar formas inovadoras e estimulantes
para as colocar em movimento”, reforçou.
Este dado médico e científico preocupa António Miguel Pina,
presidente da Câmara Municipal de Olhão, lamentando que, nas escolas do
primeiro ciclo do concelho, existam 20 por cento de alunos obesos e outros 20
por cento de pré-obesos. “Hoje, à medida que as crianças crescem, só as
melhores é que continuam a praticar desporto, as menos boas vão desistindo,
porque não jogam, não são tão bem-sucedidas como as outras. Há que encarar o
desporto como uma questão cultural e de saúde, onde o convívio com os outros
faz parte do crescimento pessoal”, salientou o edil olhanense, antigo atleta de
basquetebol, deixando ainda um recado: “Gostaria que o Comité Olímpico
Português desse a atenção e o investimento que esta iniciativa merecem”.
A finalizar as intervenções oficiais, Custódio Moreno,
diretor regional do Instituto Português do Desporto e Juventude de Faro,
destacou o papel de Gustavo Marcos na promoção do olimpismo no Algarve. “É um
sonhador e quem não sonha nunca terá projetos concretizados. Os Jogos de
Quelfes são, sem dúvida, o maior evento de educação olímpica do nosso país e
não sei se, na Europa, haverá muitos outros com esta profundidade”, referiu.
“Às vezes as pessoas passam ao lado de determinados momentos, sem perceberem a
grandiosidade do que estão a ver. O desporto não é um pódio, é incluso, é de
igualdade de géneros, não tem cor e é para todas as idades. Conceber um projeto
com esta dimensão e diversidade, para formar cidadãos para além das quatro
paredes das salas de aulas, não está ao alcance de todos”, assegurou.
Jogos de Quelfes cuja festa de encerramento, a 19 de maio,
terá lugar, precisamente, na sede do IPDJ, em Faro, para grande satisfação de
Custódio Moreno. “É importante que o governo e as entidades que estão ligadas
ao desporto percebem a grandiosidade do que está aqui a acontecer e só por
algum imprevisto de última hora é que não teremos cá o Secretário de Estado do
Desporto nessa data especial”, adiantou. “Em todas as iniciativas dos Jogos de
Quelfes existe uma forte componente de amizade e companheirismo e a educação é
muito mais do que ensinar conteúdos, é ensinar e transmitir valores. Esta é uma
sementeira cujos frutos não veremos já amanhã, mas este projeto, sem qualquer
margem para dúvida, vale a pena”.