«Cantos e Lamentos» é o novo
disco de Ricardo Martins, um virtuoso da guitarra portuguesa natural de São
Brás de Alportel que, para além de acompanhar os principais fadistas da praça
algarvia, não descura o estudo e o aperfeiçoamento deste típico instrumento
português. Guitarra portuguesa que, neste álbum, se faz acompanhar de mais uma
mão-cheia de instrumentos, resultando num trabalho que, de facto, dá gosto
ouvir.
Texto: Daniel Pina |
Fotografia: Foturistas/Musica Fundamental
Acabado de chegar de lua-de-mel e antes de abalar novamente,
desta feita a trabalho, para o Canadá e Estados Unidos, conseguimos «raptar»
Ricardo Martins para uma conversa de café, logo pela manhã, na cidade de Loulé,
para melhor conhecermos «Cantos e Lamentos», o novo disco instrumental do
mestre da guitarra portuguesa. O álbum foi gravado no Zipmix Estúdio e
misturado no Estúdio Pé de Vento, no início do ano, sendo apresentado
oficialmente, a 25 de novembro, no Club Farense, em Faro, precisamente após chegar
da tournée pelo continente norte-americano.
A guitarra portuguesa é, como se adivinha, a figura de proa
do novo trabalho discográfico de Ricardo Martins, mas o normal dia-a-dia do
são-brasense é passado a acompanhar fadistas consagrados em palco, porque ter
uma carreira a solo como instrumentista é uma tarefa dura em terras lusitanas.
“É, de facto, mais fácil acompanhar alguém que cante, há muito mais espetáculos
em virtude da recetividade do público ser maior. Mas apaixona-me o som deste
instrumento e penso que ainda há um longo caminho a percorrer em torno da
guitarra portuguesa, que a composição pode fugir um pouco das raízes do fado.
Ouço bastante música instrumental e sinto-me muito feliz a compor instrumentais
para a guitarra portuguesa, mas também componho temas para serem cantados”,
refere o entrevistado.
«Cantos e Lamentos» não é o primeiro disco instrumental de
Ricardo Martins mas é, porém, o primeiro inteiramente constituído por temas
originais. Quanto ao antecessor, intitulado simplesmente «Ricardo J. Martins»,
foi um género de «disco zero», não porque não tivesse já material próprio, mas
porque há sempre alguma hesitação e incerteza quando se vai dar a conhecer,
pela primeira vez, o que se criou na sua cabeça e coração. “O autor acha sempre
que o produto final está um bocado aquém da expetativa, mas temos que dar por
concluídos os trabalhos e colocá-los cá fora”, frisa, reconhecendo que a
concorrência existente neste nicho de mercado é de excelente nível. “Há muita
gente a tocar guitarra portuguesa, contudo, a maioria é como acompanhantes. Os
nomes mais sonantes como solistas são o Custódio Castelo, Marta Pereira da
Costa, Ricardo Rocha e Mário Pacheco, todavia, mesmo esses têm que tocar com
fadistas”, aponta.
Nomes de peso que têm em comum os largos anos de aprendizagem,
de estudo, dedicados a este característico instrumento português, quase 15 anos
no caso concreto de Ricardo Martins. “Nesta caminhada é necessário conhecer a
linguagem do antigamente, mas também as coisas mais recentes. Há que estar
aberto a outras influências para sabermos onde estamos e para onde pretendemos
ir. Há sempre puristas em todas as áreas, só que a maneira de acompanhar o fado
em meados do século passado foi-se alterando ao longo dos tempos. Claro que é
importante ir «beber à fonte» e conhecer e reconhecer todos os talentos do
passado, mas é essencial dar o nosso cunho pessoal. Para além disso, há imensa gente
a chegar ao fado proveniente de outros estilos, desde o clássico ao jazz, que
enriquecem a canção lusitana”, salienta.