A ideia da Câmara Municipal de Faro é organizar, nos dias 21 e 22 de junho, o 1.º Faro Rooftop Festival, contudo, ao aperceber-se da falta de conhecimento e troca de experiências entre os vários agentes, decidiu avançar primeiro com um encontro que, para além de intervenientes locais e regionais, contou com participantes oriundos do Chipre, Holanda, Itália, República Checa, Bélgica, Áustria e Espanha. Assim, nos dias 10 e 11 de janeiro, o 1.º Encontro Europeu de Rooftops, ou açoteias, como são tradicionalmente designadas na língua de Camões, serviu para criar sinergias entre proprietários/gestores de açoteias, arquitetos, agentes culturais, empreendedores e outras entidades que, direta ou indiretamente, nelas desenvolvem trabalho, tanto na cidade de Faro como em todo o Algarve, tendo como exemplos alguns dos casos de sucesso vindos um pouco de toda a Europa.


Ninguém duvida que as condições climatéricas, associadas às caraterísticas das construções na região algarvia – normalmente com açoteias e linhas direitas – proporcionam um enquadramento paisagístico que pode ser explorado em termos de sustentabilidade e desenvolvimento cultural e constituir um motivo de atração para inúmeras atividades com um grande impacto num turismo mais qualificado. Por isso, o 1.º Encontro Europeu de Rooftops incluiu uma visita ao centro histórico de Faro e a diversos locais com potencial para serem utilizados em futuras iniciativas; uma reunião de brainstorming com representantes da Câmara Municipal de Faro e da Boiling, a entidade organizadora do ROEF Festival em Amsterdão, um Jantar-Conferência com a participação de Mattijs Maussen, experiente profissional ligado ao desenvolvimento de estratégias sustentáveis de trabalho na União Europeia; e um workshop onde foram debatidas questões como a criação de uma rede europeia de rooftops, formas de cooperação em rede e qual o impacto positivo que um Festival de Rooftops pode ter nas políticas urbanas no futuro.

Luís Caracinha e a equipa da Epopeia Records

Valorizar e reabilitar a identidade do Algarve, do Sul de Portugal, mas também do Sul da Europa, onde os terraços são frequentemente encontrados, são objetivos da Câmara Municipal de Faro, num tempo em que as pessoas perderam o hábito de os frequentar em momentos de convívio e lazer, referiu Bruno Inácio, Chefe de Divisão da Cultura da autarquia farense, durante a sessão de apresentação dos resultados do 1.º Encontro Europeu de Rooftops, que teve lugar no Restaurante «O Castelo», no final de tarde do dia 11. “Queremos começar a pensar em termos globais num conjunto de ações que possamos realizar ao longo do ano e que deem uso a estes espaços numa perspetiva ambientalmente responsável e sustentável. Ali se podem dinamizar pequenas hortas urbanas ou jardins verticais ou colocar sistemas que contribuam para a sustentabilidade energética dos edifícios”, exemplifica, lamentando que as açoteias tenham deixado, efetivamente, de serem espaços de encontro da comunidade.

Rogério Bacalhau, Presidente da Câmara Municipal de Faro
Da troca de experiências entre os especialistas europeus resultaram diversas ideias interessantes de como se deve olhar para a paisagem urbana no século XXI, não só no que toca ao festival que o Município de Faro pretende levar a cabo, mas também nas políticas desenvolvidas em matéria de urbanismo e ambiente. “São princípios que sintetizamos num conjunto de intenções para o futuro. Durante o festival vamos desafiar a cidade a juntar-se a nós nesta grande celebração da identidade do Sul para que as pessoas possam frequentar uma série de espaços públicos e privados. Vamos procurar ter música, cinema, gastronomia, bons exemplos de sustentabilidade ambiental e energética, de como a comunidade se pode juntar em torno das suas açoteias”, resumiu Bruno Inácio, antes de passar a palavra a Luís Caracinha, da Epopeia Records, empresa que está a tratar da vertente de comunicação do Faro Rooftop Festival. “Falar de açoteias, do legado deixado pelos árabes no nosso território, é sempre gratificante. Tanto se encontram em casas pequenas de 50 metros quadrados como em palácios e são bastante diferentes na forma como são decoradas as platibandas – a faixa central do muro da açoteia que muitas vezes era decorada pelos donos das casas com motivos tradicionais. As fachadas tradicionais algarvias têm sempre cores muito ligadas ao ocre, aos amarelos, laranjas e azuis e resumimos tudo isso na imagem e conceito que criamos para o festival”, indicou Luís Caracinha.

Bruno Inácio, Chefe da Divisão de Cultura da Câmara Municipal de Faro
A finalizar a sessão, Rogério Bacalhau, presidente da Câmara Municipal de Faro, salientou a importância de se olhar para os outros quando se está a pensar em organizar algum evento. “Hoje, dificilmente se inventa grande coisa. Regra geral, utilizamos o que já existe, adequando-se, claro, às realidades locais. Tendo em conta a nossa candidatura a «Faro – Capital Europeia da Cultura 2027», temos pensado bastante naquilo que somos e naquilo que queremos vir a ser, em quais são os nossos problemas, mas também as nossas potencialidades. E as açoteias têm um significado especial para as pessoas da minha geração”, frisou o edil farense, recordando um tempo em que só existia um canal de televisão, que abria às 19h e fechava às 22h. “Não havia tablets ou telemóveis, os carros eram muito reduzidos e serviam essencialmente para se ir para o trabalho e passear um bocadinho ao sábado e domingo. Nesta época, as ruas eram o «mundo» da malta nova, que brincava à porta de casa ou nas açoteias. Foi na açoteia do meu prédio que vi muitos namoricos e onde aprendi a dançar, era lá que as senhoras domésticas estendiam a roupa para secar, que conversavam, que faziam amizades e guerras umas com as outras, e toda essa vivência se perdeu”, notou Rogério Bacalhau. “A cultura é aquilo que nos pode fazer evoluir enquanto sociedade, que pode contribuir para a paz mundial através do conhecimento que cada um dos povos tem dos outros, por isso, é algo em que estamos a apostar, para criar melhores condições para quem cá vive e para quem nos visita”.

Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina/Algarve Informativo® e Irina Kuptsova