Vários espaços da cidade cubista vão receber, de 4 a 13 de
abril, a primeira edição do FICLO – Festival Internacional de Cinema e
Literatura de Olhão, uma coprodução do Município de Olhão e do Cineclube de
Tavira, com o apoio do Programa «365 Algarve». O formato do Festival assenta
numa competição oficial composta por filmes não distribuídos
comercialmente em Portugal, ao qual se juntam três ciclos de cinema: «País
Convidado», que nesta primeira edição será a Suécia; «Realizadoras», que
se debruçará sobre uma cineasta inovadora e pouco conhecida em Portugal, Kira
Muratova; e «Obra Criativa do Festival», traduzido num convite a três
escritores portugueses contemporâneos – Alexandra Lucas Coelho, Gonçalo M.
Tavares e Nuno Moura – para escreverem um texto em diálogo com outros tantos
filmes mudos.
Anabela Afonso, António Miguel Pina, Débora Mateus e Candelas Varas |
A programação do FICLO contempla igualmente a realização
de special screenings, masterclasses, oficinas de escrita,
instalações, performances, conversas, concertos e uma livraria com
publicações nacionais e estrangeiras, que se instalará de 4 a 13 de abril numa
das bancas do Mercado da Fruta de Olhão. Durante o FICLO haverá ainda uma rota
cultural que levará os participantes num passeio fílmico em tuk tuk a locais da região que
foram palco de rodagem de filmes de cineastas icónicos, como Manoel de
Oliveira, João César Monteiro, Teresa Villaverde, ou Tony Gatlif. Quanto aos
espaços propriamente ditos de visualização dos filmes, serão o Auditório
Municipal de Olhão, a Associação Cultural Re-Criativa República 14 e a
Sociedade Recreativa Progresso Olhanense, pontos nevrálgicos de uma programação
que trará a Olhão convidados de Portugal, Cazaquistão, Suécia, Sérvia,
República Checa e Espanha, e mais de 30 filmes de cerca de 20 países.
Durante a apresentação do festival à comunicação social,
Débora Mateus e Candelas Varas, confirmaram que o FICLO tem como carta forte a
proposta de relação entre os filmes programados e a literatura, contudo, não
inclui praticamente nenhuma adaptação cinematográfica. “O FICLO vai situar-se
para além da discussão entre fidelidade e traição da eventual adaptação”,
explicam as diretoras do certame, acrescentando que os espetadores vão
vivenciar experiências cinematográficas específicas, “por vezes identificando,
e noutras pressentindo as correntes subterrâneas que ligam ambas as estruturas
narrativas”.
Preservando a sua vocação de festival internacional, do
programa constam filmes que ainda não foram exibidos em território nacional, ou
que não tiveram estreia comercial, entre os quais a obra «Agatha et les
lectures illimitées» realizado pela escritora e cineasta Marguerite Duras em 1981.
E as surpresas começam logo no dia 4 de abril, com o chef Adérito de Almeida a apresentar
um Menu Fílmico inspirado no filme de abertura do festival, «The Gentle
Indifference of the World», de Adilkhan Yerzhanov, havendo, inclusive, uma masterclass a bordo do Sun Concept, um
barco movido a energia solar concebido e produzido em Olhão. São, por isso, enormes
as expetativas em relação ao FICLO, confessou Anabela Afonso, comissária do
«365 Algarve». “Festivais de cinema existem alguns, festivais literários
também, festivais que ligam as duas vertentes não haverá muitos em Portugal e
no Algarve é certamente o primeiro. O «365 Algarve» é um projeto que pretende
demonstrar que a programação cultural da região pode constituir um fator de atração
turística e as Secretarias de Estado da Cultura e do Turismo têm envidado
vários esforços para divulgar Portugal e o Algarve enquanto destinos para se
rodarem filmes, daí que apoiar um festival desta natureza é uma oportunidade
para se complementar essas iniciativas”, frisou Anabela Afonso.
A comissária do «365 Algarve» lembrou, porém, que “estas
coisas demoram tempo para gerar resultados e é preciso o empenho de todos os
agentes culturais envolvidos”, acrescentando que a proposta do Cineclube de
Tavira é muito aliciante. “A literatura e o cinema serão provavelmente as duas
áreas mais ricas do que pode haver em termos de produção artística. Todos temos
filmes que nos marcaram e os livros das nossas vidas e colocar em diálogo estes
dois universos é bastante interessante. O Algarve pode vir a constituir-se como
uma região mais procurada para residências ou retiros para criação artística e
um festival como o FICLO cria vários pontos de encontro entre artistas com ou
sem experiência. É uma semente que, bem tratada, pode dar ricos frutos para a
região”, acredita Anabela Afonso.
O FICLO é, também, uma das boas «dores de cabeça» que o
Município de Olhão pretende dar à programação do «365 Algarve», avisou, com um
sorriso, o autarca António Miguel Pina. “Fazem-se muitas coisas boas, não só em
Olhão, mas em todo o Algarve, em termos culturais e este programa tem constituído
uma alavancagem fundamental nesse aspeto. Sabemos que não são eventos para
grandes públicos, mas têm que ser tendencionalmente para cada vez mais gente”,
defendeu, antes de agradecer a Débora Mateus e Candelas Varas pela ousadia de
criarem este Festival Internacional de Cinema e Literatura de Olhão.
António Miguel Pina enalteceu, igualmente, o maior entrosamento
que existe entre cultura e turismo nos eventos da terceira edição do «365
Algarve», um «casamento» que, aliás, esteve na origem do programa conjunto das
Secretarias de Estado da Cultura e Turismo. “O Algarve é um destino sobejamente
conhecido pelo sol e praia, é esse o modelo económico da região há muitos anos,
mas somos cada vez menos competitivos se estivermos apenas a pensar no preço do
alojamento. A parte sul da Bacia do Mediterrâneo vende os quartos a valores que
não conseguimos oferecer mas, se olharmos para o lado norte, para a Cote d’Azur,
Cannes, Mónaco, a Riviera Francesa e Italiana, aí vende-se o quarto a valores
10 vezes superiores aos do Algarve”, apontou o presidente da Câmara Municipal
de Olhão, entendendo que é a questão cultural a responsável por essa diferença.
“São zonas com menos sol, não têm as nossas belas praias, mas há algumas
décadas apostaram em ser um destino também de cultura. Sol e praia existem em
muitos lados, mas, se associarmos isso à segurança e a uma oferta cultural de
grande nível, as escolhas são menores e os turistas de maiores posses económicas
estão disponíveis para pagar por isso”.
Este é, contudo, um caminho que demora a trilhar, portanto, António
Miguel Pina antevê que só talvez daqui a 10 anos, a 10 edições destes programas,
é que se comece a sentir o resultado financeiro deste investimento na cultura. E
Olhão quer contribuir para essa caminhada, adiantou o edil. “Estamos altamente
motivados para criar mais quatro ou cinco grandes eventos para assegurar uma
programação contínua no período de época baixa, de modo a juntar-se ao FICLO e
ao «Poesia a Sul». É um desafio que vamos agarrar já nos próximos dias”, garantiu
o presidente da Câmara Municipal de Olhão.
Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina/Algarve
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