Pensa-se que Sun Tzu tenha sido um general, estratega e filósofo do Período dos Reinos Combatentes do Império Chinês, em meados do século V a.C. É-lhe atribuída a autoria da obra «A Arte da Guerra», apesar de hoje essa possibilidade ser discutida, tal como a existência do próprio. Sendo uma obra de características e conteúdos militares, a «Arte da Guerra» é hoje usada para os mais diversos fins: da estratégia militar à gestão de empresas ou à capacidade de liderança e de chefia. De leitura obrigatória para muitas gerações de militares, a obra tornou-se um clássico no mundo empresarial, fornecendo aos gestores inspiração para responderem aos desafios com que se veem confrontados num mundo cada vez mais globalizado.

Segundo a obra, existem cinco fatores que permitem que se preveja qual dos oponentes sairá vencedor: aquele que sabe quando deve ou não lutar; aquele que sabe como adotar a estratégia militar apropriada de acordo com a superioridade ou inferioridade das suas forças frente ao inimigo; aquele que sabe como manter os seus superiores e subordinados unidos de acordo com as suas propostas; aquele que está bem preparado e enfrenta um inimigo desprevenido; aquele que é um general sábio e capaz, em cujas decisões o soberano não interfere.

Por nunca ter deixado de existir, mas sim metamorfosear-se, a guerra nunca deixou de estar na ordem do dia. Então, é caso para nos questionarmos se, sendo a guerra uma ação/reação intrinsecamente humana, constituirá a mesma uma arte, apenas por nos ensinar a evitar o conflito, fenómeno social comum a tantas outras espécies?

Não havendo uma única definição para o que é a arte, é difícil definir um significado absoluto para uma atividade que reúne uma produção tão vasta e diversificada ao longo do tempo. Sendo a arte associada à comunicação humana e, maioritariamente, à expressão de emoções, dúvidas e anseios, tanto existenciais, sociais ou puramente estéticos, é-me difícil associá-la à guerra. Sei que «A Arte da Guerra» é apenas um título, mas, ainda assim, causa-me algum incómodo ver a destruição associada à arte.

Apesar da arte ser realizada nos mais variados meios, linguagens e técnicas, os artistas geralmente compartilham o desejo de transmitir sentimentos e emoções através da criação e da construção: “A arte é essencialmente a afirmação, a bênção e a divinização da existência”, Nietzsche; “Arte é a disposição humana de matéria sensível ou inteligível para um fim estético”, James Joyce; “A arte é a assinatura das civilizações”, Jean Sibelius; “O propósito da arte é tirar a poeira da vida diária das nossas almas”, Picasso; “A arte é a descoberta e o desenvolvimento de princípios elementares da natureza em belas formas adequadas ao uso humano”, Frank Lloyd Wright.

Num tempo em que a guerra se aproxima mais do «nosso» ocidente e nos faz recordar outros tempos, não muito distantes, em que vários países se uniram no propósito de se defenderem contra a irracionalidade de guerras provocadas em nome de conquistas territoriais, políticas e ideológicas, assaltam-nos pensamentos em que damos conta da nossa pequenez, fragilidade e dependência. Todos sabemos, mas teimamos em esquecer, que não há guerras boas nem más e, mais importante do que isso, numa guerra não há vencedores nem vencidos, pois muitos terão de perder para alguém, pretensamente, assumir-se como vencedor.

Se há algo que aprendi e intuí enquanto fui instruendo e instrutor de artilharia ligeira é que as armas só ferem e matam se forem manipuladas. O poder sempre esteve e estará na mão de quem tem o poderio de mandar destruir. A autoridade, a repressão e o medo são os agentes catalisadores que alimentam as guerras que proliferam pelo mundo, tendo como denominador comum os interesses pessoais daqueles que, em nome da história, do território, da etnia, da raça e de outros motivos mandam matar os filhos, pais, irmãos e maridos do seu e dos outros povos. Por isso, já me cansa ver tantos especialistas duma pseudo-arte a explicar e a comentar nos vários canais de tv as estratégias de quem, à nossa revelia e à custa da nossa ignorância, usa a guerra para proveito seu e dos seus.

Militares e/ou civis, somos meros peões transformados, em menos de nada, em carne para canhão. Porque, por mais que alguns doutos peritos militares o defendam, a guerra como a conhecemos não tem lógica, ética, moral nem utilidade! Arte? Muito menos.

Paulo Cunha é professor