Quase a aproximar-me do dia em que faria 60 anos de vida, e tendo em conta que o número é redondo, significativo e relevante para quem o perfaz e para quem o acompanha, resolvi convidar para uma celebração conjunta familiares e pessoas que sinto como amigos. Não foi difícil escolher quem me iria acompanhar nesta entrada para uma nova década. Sabendo que os familiares e amigos que a morte me roubou continuam vivos no meu coração, restava-me, naturalmente, convidar as pessoas que me ajudaram a levantar os alicerces que me permitiram chegar onde cheguei e tornar-me no que hoje sou. Gente com um percurso de vida que com o meu se entrecruzou, pontuando-o com momentos marcantes para o meu crescimento intelectual e emocional. Gente que, como eu, continua a privilegiar as relações com passado por contraponto com as relações de circunstância e efémeras, logo, sem futuro.

Não antevendo o meu aniversário como uma festa, desde logo lhe chamei «Celebração de Vida». Para muitos, sendo a celebração da vida entendida como uma forma positiva e significativa para honrar e lembrar alguém que faleceu e que, ao contrário da atmosfera sombria e focada na perda de um funeral tradicional, pode centrar-se nas experiências positivas e nas contribuições da pessoa para a vida das outras pessoas. Neste caso, o pretenso morto (eu) estaria vivo e não pretendendo juntar pessoas para falar de mim, queria apenas trocar momentos de vida (memórias e afetos) com os presentes. Ora, para que tal acontecesse quais seriam então os pressupostos? Obviamente, ter gente ao meu lado que ao longo da vida, para além das palavras, me tivesse dado provas de ser meu amigo.

A lealdade, a confiança, a aceitação incondicional, a empatia, a compreensão, a disponibilidade, o apoio, a comunicação aberta e honesta, a celebração das conquistas, o respeito, a reciprocidade, a persistência no relacionamento, a adaptação às mudanças e a honestidade construtiva são as características qualitativas que nos permitem reconhecer os Amigos. Porque não há amigos verdadeiros nem falsos, apenas amigos, a identificação dos verdadeiros amigos requer tempo e experiência. Às vezes, é necessário passar por diferentes relacionamentos para encontrar aqueles que se encaixam nesses critérios. É essencial cultivar relacionamentos saudáveis e valorizar as pessoas que demonstram essas qualidades para connosco.

Sim, sou plenamente a favor que usemos os aniversários e/ou outras celebrações como «Celebrações de vida» e, desejavelmente, feitas em vida. Como? Escolhendo locais que tenham significado para os convivas ou que permitam uma atmosfera leve e acolhedora; decorando o espaço com motivos ligados e representativos de todos (fotos, arte, flores ou objetos que tenham significado especial); contando estórias positivas e inspiradoras sobre a vida dos presentes; incluindo elementos interativos como músicas favoritas, danças, leituras de poesia, apresentações de fotos e/ou vídeos; partilhando alimentos e bebidas que os amigos têm em comum, podendo dar a conhecer pratos especiais e novas receitas; criando um espaço para os presentes deixarem mensagens, fotos ou lembranças que possam ser compartilhadas; reservando períodos para refletir sobre o legado e o impacto que cada um teve no grupo de amigos; manifestando e partilhando a disponibilidade de conexão e apoio entre todos os presentes. Entrei nos «sessenta» com a firme convicção que, para além de outras riquezas não materiais com que fui bafejado ao longo da vida, a amizade é indubitavelmente uma delas. Bastou sentir o que senti quando vi uma sala cheia de amigos (meus) em profusa e bem-disposta cavaqueira. Há lá melhor oferenda: ver os «nossos» juntos e felizes? Experimentem!

Paulo Cunha é professor

Crónica publicada em:

Foto: Daniel Santos