Estive recentemente na Escócia. É a terceira vez que ali vou para caminhar e apreciar a natureza. As belas paisagens de montanha, entrecortadas por extensos campos e lagos, a rica história e a simpatia dos seus habitantes são aspectos que me atraem neste país (além do clima bem mais fresco do que nosso!). Os escoceses terão certamente muitos defeitos e coisas a melhorar. Mas há algo na sua simplicidade e nos cuidados com que tratam o território que me agradam particularmente. Pequenos detalhes que revelam o quão significativo é o seu empenho pelo bem comum e o conforto das pessoas. Alguns exemplos:
As cidades
Edimburgo, Inverness ou Portree, esta última da Ilha de Skye, são atraentes urbes, com forte ligação ao espaço natural envolvente. Os canais de água que atravessam e percorrem estas cidades, por exemplo, com maior ou menor escala, são extensos corredores verdes, de ampla utilização social e desportiva, munidos de trilhos, caminhos pedestres ou ciclovias. Estão limpos, cuidados e preparados para receber os muitos visitantes diários. Foram alvo de atenção cuidada, mas simples, a pensar nos habitantes e visitantes de fora, como parte de um cartão de visita. E constam, por isso, nos roteiros turísticos recomendados.
Os jardins
É sabido a grande paixão e apelo dos britânicos em geral pelos jardins. Na Escócia passa-se o mesmo. Todas as casas têm um pequeno jardim, bem tratado e mantido, funcionando como que um cartão de visita. Os espaços verdes mais amplos, em pleno casco urbano, têm, em muitos locais, talhões atribuídos aos moradores locais que ali cuidam e mantêm recantos ajardinados. E em muitos sítios, mesmo nos mais remotos, há jardins comunitários, instalados e mantidos pelas gentes da terra, com convites ao usufruto dos mesmos por quem ali passe.
Os bancos de jardim
Há numerosos bancos de jardim espalhados um pouco por todo o lado, sempre em locais de particular beleza paisagística. Todos têm uma pequena placa metálica, no encosto, com dedicatória inscrita em memória de um ente querido que se perdeu. Tratam-se, na verdade, de oferendas particulares ao espaço publico, ao comum do utilizador, a pensar no bem estar de quem ali passeia e em paralelo, preservando a memória de um ente adorado. Tão simples e significativo. Uma bonita forma de imortalizar alguém.
Os caminhos pedestres
Há muitas opções de caminhadas na Escócia. Em cidades, no campo, junto à costa, ao longo dos numerosos lagos ou nas montanhas. São, na sua maioria, trilhos e caminhos antigos, bem preservados, em muitos casos com o envolvimento de voluntários e organizações locais. A sinalização, ao contrário do que por aqui se faz, é muito simples e barata. Uns postes de madeira, com cores, produzidos quase que artesanalmente, colocados nos sítios estratégicos e em mínimos possíveis. O foco, esse, recai nos caminhos. Bem mantidos, conservados e sob vigilância atenta ao desgaste, degradação ou obstrução por vegetação.
Estes simples exemplos mostram quão diferentes somos na gestão de coisa pública e na forma como procuramos criar conforto aos residentes e aos visitantes. Por cá, no caso dos percursos, investem-se dezenas ou centenas de milhares de euros em sinalética, com soluções sofisticadas, incluindo postes em plástico reciclado ou setas de PVC gravadas a laser e esquecemo-nos do verdadeiramente importante: a manutenção dos caminhos e dos trilhos em si e como tratá-los de forma a cumprirem a sua principal função: serem atractivos, acolhedores, seguros e interessantes.
Nos jardins, novamente, temos outra forma de actuar. Peculiar, até. Ao invés de mantermos, criarmos e expandirmos os espaços verdes – que são vitais para o sucesso no combate às alterações climáticas e no conforto térmico das cidades – estamos a podar árvores de forma quase mortal, a deixar secar zonas verdes devido a restrições do uso de água – argumento este, no mínimo ridículo – e a betonizar cada vez mais o solo, seja ele urbano ou rural.
Nem tudo é melhor do que por cá se faz, obviamente. Mas naquilo que são as elementares iniciativas governativas em prole do bem estar comum ou da preparação dos espaços urbanos ou rurais face a um futuro cada vez mais exigente do ponto de vista ambiental, social e até económico, temos muito que aprender. A Escócia dá-nos algumas lições. Aconselho uma visita!
João Ministro é engenheiro do ambiente e empresário
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