Vassily Kandinsky
A obra de um artista é a sua afirmação de si no mundo dos outros. É a sua língua, ou, mais que língua, a sua linguagem – construída laboriosamente ao longo dos anos, torna visível a assinatura que faz reconhecer um determinado artista entre tantos. Tal não quer dizer, de modo algum, que ele (ou ela) sejam obrigados, para não perder a identidade, a fazer sempre o mesmo com algumas variações. A linguagem do artista é expansiva e, muitas vezes, funciona de forma paradigmática – uma obsessão que atrai sentidos diversos, novas formas e meios de expressão; que não funciona em linha reta, mas percorre os tortuosos caminhos da mente de quem a criou. Pode dizer-se que cada artista cria um idioleto, uma forma só sua de expressar ideias, de revelar aquilo que o interessa e que quer partilhar.
Xana é um artista de obsessões. As suas obras, gráficas ou tridimensionais, complementam-se, dialogam, criam um alfabeto próprio, através do qual o artista apresenta conceitos do universo da estética e da história da arte. Será possível, ainda, pensar na arte contemporânea como bela? Ou politizada, ao ponto de buscar a liberdade? (Seja liberdade de criação, seja o conceito de liberdade em si mesmo). Será a arte uma forma de sabedoria/conhecimento, capaz de promover a felicidade? E será que esses conceitos, na obra de Xana, dizem aquilo que outrora disseram ou funcionam como gatilhos capazes de disparar, no público, verdades (?) sobre a arte e sobre a condição de ser artista?
Esta exposição funciona como uma antologia das suas obras desde 2011 até à atualidade. Os desenhos foram organizados em quatro núcleos: OLEB, FELCIA e LBRD (2011 a 2015); Milagre OLEB (2020); CENTRO (2020-2023); e A Passagem (constituída por desenhos e obras escultóricas site specific, feitas em madeira policromada).
Cada um destes núcleos é constituído por um alfabeto próprio que reflete, não só, fases diferentes da obra de Xana, como apresenta a fala do artista diante (e sobre) o próprio universo artístico. As cores vivas constituem-se como marca registada de um artista que começa seu percurso nos gloriosos anos 1980 – período de efervescência cultural num país recém-saído de uma ditadura e recém acolhido pela União Europeia. Mas, entre os desenhos, alguns prescindem da cor e apelam ao gesto, um gesto que procura recuperar o momento em que a arte não se descrevia, apenas se inscrevia nas paredes.
O problema da escritura/inscrição é também central num artista que pretende falar a partir do seu verdadeiro meio: a criação artística. Sem perder a profundidade daquilo que diz, Xana prefere dizê-lo com desenhos e obras tridimensionais, não se deixando influenciar pela linguagem externa à arte, que se constitui como crítica ou História.
Ouvi, há anos, uma frase, dita por um psicanalista, que me fez pensar em Xana e no seu corpo de trabalhos – O homem fala, a mulher borda. A mulher aqui é um conceito mais amplo que não representa apenas o feminino, mas abarca todos aqueles que fogem do regime falocrático. De um regime da fala e pela fala que nos obrigada a dizer, repetindo ou concordando com o que foi dito antes de nós, e nunca por nós mesmos. Ao escapar do regime da fala (e da falocracia), Xana reafirma a liberdade do artista de escolher como vai fazer a sua obra comunicar e como vai criar, com ela, novas e impossíveis linguagens que não se deixam aprisionar pelo regime do escrito, mas inscrevem-se num discurso outro, mais vívido e sensível, mais direto e original.
Xana é um artista de obsessões. As suas obras, gráficas ou tridimensionais, complementam-se, dialogam, criam um alfabeto próprio, através do qual o artista apresenta conceitos do universo da estética e da história da arte. Será possível, ainda, pensar na arte contemporânea como bela? Ou politizada, ao ponto de buscar a liberdade? (Seja liberdade de criação, seja o conceito de liberdade em si mesmo). Será a arte uma forma de sabedoria/conhecimento, capaz de promover a felicidade? E será que esses conceitos, na obra de Xana, dizem aquilo que outrora disseram ou funcionam como gatilhos capazes de disparar, no público, verdades (?) sobre a arte e sobre a condição de ser artista?
Esta exposição funciona como uma antologia das suas obras desde 2011 até à atualidade. Os desenhos foram organizados em quatro núcleos: OLEB, FELCIA e LBRD (2011 a 2015); Milagre OLEB (2020); CENTRO (2020-2023); e A Passagem (constituída por desenhos e obras escultóricas site specific, feitas em madeira policromada).
Cada um destes núcleos é constituído por um alfabeto próprio que reflete, não só, fases diferentes da obra de Xana, como apresenta a fala do artista diante (e sobre) o próprio universo artístico. As cores vivas constituem-se como marca registada de um artista que começa seu percurso nos gloriosos anos 1980 – período de efervescência cultural num país recém-saído de uma ditadura e recém acolhido pela União Europeia. Mas, entre os desenhos, alguns prescindem da cor e apelam ao gesto, um gesto que procura recuperar o momento em que a arte não se descrevia, apenas se inscrevia nas paredes.
O problema da escritura/inscrição é também central num artista que pretende falar a partir do seu verdadeiro meio: a criação artística. Sem perder a profundidade daquilo que diz, Xana prefere dizê-lo com desenhos e obras tridimensionais, não se deixando influenciar pela linguagem externa à arte, que se constitui como crítica ou História.
Ouvi, há anos, uma frase, dita por um psicanalista, que me fez pensar em Xana e no seu corpo de trabalhos – O homem fala, a mulher borda. A mulher aqui é um conceito mais amplo que não representa apenas o feminino, mas abarca todos aqueles que fogem do regime falocrático. De um regime da fala e pela fala que nos obrigada a dizer, repetindo ou concordando com o que foi dito antes de nós, e nunca por nós mesmos. Ao escapar do regime da fala (e da falocracia), Xana reafirma a liberdade do artista de escolher como vai fazer a sua obra comunicar e como vai criar, com ela, novas e impossíveis linguagens que não se deixam aprisionar pelo regime do escrito, mas inscrevem-se num discurso outro, mais vívido e sensível, mais direto e original.
Mirian Tavares é professora
Crónica publicada em: