A água é um recurso vital e escasso que enfrenta nos dias de hoje e enfrentará, num futuro próximo, crescentes desafios de gestão, desafios esses que serão assimétricos no território nacional, nos vários usos, mas em que um dos setores necessitará de evoluir rumo a uma maior eficiência hídrica e maior contribuição para o desenvolvimento económico do País e da região, nomeadamente o setor agrícola.


A história e a experiência noutros países permitem observar que, embora os problemas de água sejam recorrentes e variem ao longo do tempo, muitos deles têm solução, e essa solução passa por uma gestão eficiente e integrada dos recursos disponíveis. Em Portugal, essa realidade é notavelmente assimétrica, com regiões como o Algarve que enfrenta escassez significativa, enquanto outras partes do país mantêm reservas suficientes.

A questão da escassez de água, particularmente no Algarve, muitas vezes é atribuída à falta de precipitação ou a eventos climáticos adversos. No entanto, o problema real não está apenas e só na quantidade de água disponível, mas também na forma como ela é gerida. A existência de inúmeras entidades gestoras de água no País, que nos últimos 10 anos não foram capazes de melhorar a eficiência das suas infraestruturas, muitas mantendo perdas que superam 25% sem qualquer penalização, sendo um exemplo de ineficiência estrutural que agrava a perceção de escassez e que em anos com menos precipitação colocam maior pressão nas diversas origens de água. Mas não é só no setor urbano que essa ineficiência persiste, a falta de medição e controlo adequado do consumo, especialmente no setor agrícola, acentua ainda mais esse problema.

A agricultura é de longe o maior consumidor de água em Portugal, e no Algarve, ela compete diretamente com o abastecimento público e o turismo. No entanto, é necessário e urgente repensar os tipos de culturas que estamos a produzir, especialmente as que têm um baixo valor de mercado, que embora sejam de excelente qualidade e isso ninguém duvida, têm uma rentabilidade extremamente baixa. A água utilizada para produzir produtos agrícolas baratos, destinados a exportação a granel, não pode ser e não é justificada do ponto de vista económico ou ambiental.

As soluções para otimizar o uso da água na agricultura terão de passar pela adoção de culturas de maior valor agregado, i.e., apostar em culturas mais rentáveis podem melhorar a sustentabilidade financeira dos agricultores, permitindo-lhes obter mais lucro com menos recursos hídricos. Paralelamente, a introdução de novas práticas de irrigação eficientes, separar o abastecimento público da agricultura, a introdução de um modelo regulatório que incentive uma maior eficiência e avalie os consumos das produções agrícolas, a implementação de um tarifário mais justo que obrigue a escolhas mais racionais nos investimentos e a aposta na reutilização de águas residuais tratadas, serão essenciais para reduzir a pressão sobre as fontes de água potável por parte do setor agrícola.

A solução para os desafios hídricos de Portugal, particularmente no Algarve, não passa apenas por encontrar novas fontes de água, mas passa por colocar o foco na eficiência dos diversos setores na utilização do recurso água, tarefa reconhecidamente desafiante, mas fundamental face à redução da pluviosidade estimada para as próximas décadas.

É necessário um diálogo aberto entre todos os setores envolvidos, para que as decisões que temos de tomar sejam baseadas em dados rigorosos e em análises técnicas de impacte ambiental, social e económico. Se bem implementadas, essas soluções poderão garantir um futuro sustentável, sem a necessidade de restrições penosas ao uso da água. Pensem nisto.

Carlos Manso é Economista e Membro da Direção Nacional da Ordem dos Economistas

Crónica publicada em:
REVISTA ALGARVE INFORMATIVO #454 by Daniel Pina - Issuu

Nota: Este artigo de opinião apenas reflete a opinião pessoal e técnica do Autor e não a opinião ou posição das entidades com quem colabora ou trabalha.