“Se quer que o seu filho seja inteligente, leia-lhe contos. Se quer que seja ainda mais inteligente, leia-lhe mais contos”.
Einstein (citado por Carlos Nuno Granja em A arte de gostar de ler, Livros Horizonte, 2024)
Salman Rushdie inicia o seu livro de ensaios Linguagens da Verdade com um capítulo intitulado «contos maravilhosos», onde refere o modo como as crianças alimentavam a alma com histórias, que lhes despertavam a imaginação, elemento essencial que as acompanharia por toda a vida. Refere ainda: “Acredito que os livros e as histórias por quem nos apaixonamos fazem de nós quem somos; ou para não pedir muito, que o ato de nos apaixonarmos por um livro ou por uma história nos muda de alguma forma, e que o canto adorado se torna parte da nossa imagem no mundo, parte do modo como entendemos as coisas e fazemos juízos e escolhas na nossa vida de todos os dias” (p. 11). Subscrevo inteiramente estas palavras que me tocam de forma ainda mais intensa, ao ter começado a lecionar Literatura para a Infância, à Licenciatura em Ensino Básico da Escola Superior de Educação de Setúbal. É que, como refere Ana Cristina Silva, num texto publicado no Diário de Notícias, de 3 de Novembro deste ano, a literatura para a infância é o espaço onde os estereótipos se desfazem, visto que “os livros de histórias infantis podem ser estradas, caminhos que abrem as mentes das crianças para o desenvolvimento da empatia e para a compreensão das emoções dos outros”. É neste universo que tudo principia, que os leitores nascem, embora depois, tantas vezes se percam mais tarde, com o seu desejo de ler e de saber naufragado nas tempestades da vida e do quotidiano. E como despertar o desejo de ler nos mais jovens? Como acender e atear essa chama que fará toda a diferença na vida e no futuro? Sabemos que é difícil encontrar receitas, mas, neste contexto, recomendo a leitura do livro de Carlos Nuno Granja (autor de um notável conjunto de cerca de 40 livros infantis publicados), intitulado A Arte de gostar de ler, da editora Livros Horizonte. Nesta obra, encontramos, não apenas pertinentes reflexões sobre os benefícios da leitura, a sua situação na sociedade atual, mas também excelentes sugestões e exercícios para a sua promoção, baseados na vasta experiência do autor como professor, escritor, bibliotecário e mediador de leitura. E claro, no princípio de tudo, há a paixão pelos livros, pela leitura, o desejo de a partilhar, pois importa salientar que “uma comunidade leitora é uma comunidade interventiva, consciente da sua participação cívica e promotora do espírito crítico, sendo como tal, capaz de evoluir contra comportamentos dúbios e prejudiciais ao bem-estar de todos” (Granja, p. 125). Não será precisamente este um dos ingredientes que fazem falta na nossa sociedade, num momento em que, cada vez mais, cada indivíduo se exila na sua bolha, de olhos colados ao telemóvel, alheio ao mundo circundante?
Com efeito, numa sociedade marcada pela voracidade do imediatismo, da futilidade, dos escândalos ocos, dos heróis vazios das redes sociais, torna-se cada vez mais necessário, partir do conselho de Einstein. Ler, partilhar leituras, livros, abrir caminhos, para que o amanhã não se converta num reino de inteligência artificial (onde a natural jaz sete palmos abaixo de um ecrã), para que o nosso futuro não seja um mero naufrágio de ilusões num mar de desumanas artificialidades.
Dora Gago é professora
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