Estima-se que um total de 3.500 homens, a pé e mais 1.500 a cavalo, terão saído de Ourém, em fevereiro de 1249, entrando por Almodovar e Salir atravessando a serra pelas Cortiçadas. Uma armada naval também saiu de Lisboa para se posicionar frente a Faro, a principal cidade do Algarve Ocidental e onde estaria o maior bastião dos mouros resguardados pelas defesas de taipa e as muralhas até à Ria Formosa (sete hectares bem caracterizados por Al Idrisi).
Os cristãos montaram cerco durante quase um mês, com o próprio monarca a comandar as operações que cercaram a cidade e inviabilizaram o envio de reforços de Niebla/Sevilha ou por mar. Até que os sitiados, com o Alcaide mouro, negociaram a rendição a Dom Afonso III que tinha entrado no Castelo apenas com 10 cavaleiros a acompanhá-lo. A partir daqui e nos meses seguintes, as praças de Loulé, Porches, Silves, Aljezur, Porches, passaram para o campo da cristandade, sem saques ou massacres. Paderne, Tavira e outras localidades já haviam sido conquistadas.
Seguiu-se uma incessante negociação com o Rei de Leão e Castela, Alfonso X, para que reconhecesse estas como novas terras de Portugal. Leão e Castela reivindicou-as como suas, pois que antes da rendição a Afonso III já o Reino de Niebla (de onde o Alcaide de Faro era dependente) se tinha tornado vassalo da coroa de Castela. E é interessante, por isso, como nas armas da atual coroa de Espanha consta ainda o escudo do Algarve.
Nesta parte estou tentado a seguir a escrita ainda naquele tempo e lembrar que a Santa Sé excomungou o nosso Rei por… ter aceite casar com a filha do Rei de Leão e Castela, Beatriz de seu nome, para assim resolver duas questões, por um lado a Rainha consorte (D. Matilde, repudiada em 1250) não lhe conseguia dar descendência e, por outro, Alfonso X (O Sábio) prometeu-lhe o Algarve «em doação» se deste casamento nascesse filho varão que atingisse a idade de 7 anos. O avô castelhano deste neto assim nascido, o nosso D. Dinis, antecipou o cumprimento da promessa e o nosso Afonso III (de facto), assim como D. Dinis, de direito, (tratados de Badajoz 1267 e de Alcanizes 1297) vieram a designar-se já Rei de Portugal e do Algarve[1] e, na segunda data, com a fixação dos limites fronteiriços entre os dois reinos.
Tal como «O sábio» que das letras lembramos as Cantigas de Santa Maria (ver armas da cidade de Faro), também do seu neto «O Trovador» conhecemos a fundação da Universidade de Lisboa/Coimbra (Estudos Gerais), de ter sido patrono das artes e também uma centena de composições poéticas e musicais. Também foi D. Dinis que criou a Ordem de Cristo (1318) com sede, aqui, em Castro Marim (sucedânea, nos bens, da Ordem dos Templários).
As relações entre conquistas de territórios de forças de Portugal que vinham rumo ao sul e dos mouros ou muçulmanos (não são completamente sinónimos) que o ocupavam e das relações destes, com Castela, são muito interessantes e, hoje, relevo outras poucas, mas relevantes, ocasiões (antes da primeira conquista de Silves) e que traz a este texto o nosso Fundador, que encontrou acordo com os mouros (1173) para uma incursão nestas terras para a trasladação das relíquias (os restos mortais) do mártir de S. Vicente, desde o nosso cabo Sacro, para Lisboa, onde se tornou o seu santo padroeiro (vide a marca da capital com a barca e os nossos corvos que daqui o acompanharam).
Assim como, antes, o acordo[2] com Ibn Qasî (1147) e troca de ofertas de cortesia e respeito (um cavalo, lança e escudo) com este Senhor do Al-Andaluz (do Gharb até Évora e até mesmo Sevilha, que tomou por breves meses) supõem-se, para que Lisboa fosse tomada sem massacres dos mouros locais (o que se tornou, afinal, impossível dada a participação dos Cruzados do Norte da Europa que reivindicaram os bens do saque). Ibn Qasî perdeu a cabeça (literalmente) por revolta dos seus seguidores que a exibiram, em Silves, como a do traidor que fez amizade com «Ibne Arrique» (como designavam o nosso I de Portugal).
Este último (o acordo com Ibn Qasî), faz-nos questionar, recuando ainda mais no tempo, a 1139, se no episódio da Batalha de Ourique, em que aquele não participou, onde Dom Afonso Henriques foi aclamado Rei de Portugal, poderá ter uma interpretação que a ter-se mantido poderia ter transformado a nossa História (a do Algarve) pois que D. Afonso Henriques estaria, a partir dessa vitória, parando e sustendo aí no Sul, interessado em progredir mas para o norte peninsular (Galiza) integrando-a no Reino de Portugal (desejo que o perseguia desde a conhecida contenda com a mãe D. Teresa por ter tomado o partido dos interesses dos galegos)…
O filho de Dom Afonso Henriques, Dom Sancho I, voltou-se, afinal, para o Algarve (Silves) logo em 1189.
O que seria o ocidente Andaluz (o Algarve) se Alfonso X não tivesse acordado com Afonso III a sua integração na coroa portuguesa? A ponte ferroviária já estaria a ligar as duas margens e o eixo-mediterrânico de velocidade alta estaria a chegar a Lagos? Os nuestros hermanos não conheceriam a nossa gastronomia fantástica e nós frequentávamos os tradicionais chiringuitos.
Sinceramente, apesar desta tentativa de gracejo, prefiro gostar do curso que a nossa História tomou.
Esta minha brevíssima intromissão na História, pedindo muita indulgência dos verdadeiros historiadores, que respeito, pretende apenas aproveitar a coincidência da data da publicação deste meu texto no Algarve Informativo com a comemoração da tomada de Faro aos Mouros, repetindo a proposta que esta data seja declarada, pela AMAL, o Dia do Algarve[3]. Viva o Algarve![4]
Ainda assim, não perco esta oportunidade de Vos convidar a conhecer, com enlevo, a relação assumida do nosso Afonso III com a filha do Alcaide Mouro Ben Bakr (Madragana Ben Aloandro) em Faro que deu linhagem, de gerações, até à princesa Carlota (do norte da Europa) que veio a casar com o Rei de Inglaterra e ser avó da Rainha Vitória. Viva Faro! Viva Portugal!
Estou a acreditar, depois desta, que os leitores do Algarve Informativo preferirão que volte a escrever só sobre Política e atualidades…
Paulo Neves é um «ilhéu», mas nenhum homem é uma ilha
Crónica publicada em:
REVISTA ALGARVE INFORMATIVO #474 by Daniel Pina - Issuu
Foto: João Neves dos Santos
[*] História Militar de Portugal, Nuno Severiano Teixeira (Coordenador), A esfera dos Livros, 2017
[1] Sem descurar que, pela conquista de Silves, em 1189, já D. Sancho I, filho de D. Afonso Henriques, se tinha acrescentado ao título de Portugal, também o do Algarve (que veio a perder logo depois com a retomada dos mouros). Já depois, mas no reinado de D. Sancho II, este terá entrado pelo Baixo Guadiana (no Gharb al Andaluz) tendo conquistado Ayamonte.
[2] Pode ter consistido afinal por não haver reforços a partir de Évora em auxílio de Lisboa e por troca de o Al-Andaluz não ser atacado. De facto, foi o Alcaide de Évora (Al Mundhir) que terá mandado chacinar o seu Senhor Ibn Qasî, que o substituiu também em Silves e fez dispersar os seus seguidores no Ribat da Arrifana, em Aljezur.
[3] Em boa hora assinalado, hoje e pela terceira vez, pelo Corpo Consular acreditado no Algarve em honra aos algarvios que tão bem têm acolhido as comunidades de cidadãos estrangeiros residentes que representam e os que nos visitam nesta atividade que assumimos como a indústria da Paz.
[4] Hino já temos aprovado pela AMAL (composição do Maestro Armando Mota e letra de José Carlos Barros). A bandeira regional, sugiro a que a história nos deixou, conhecida, com os 2 reis cristãos e os 2 mouros em respeito à cultura e identidade da terra, com as cores ocre que nos marcam.
[1] Sem descurar que, pela conquista de Silves, em 1189, já D. Sancho I, filho de D. Afonso Henriques, se tinha acrescentado ao título de Portugal, também o do Algarve (que veio a perder logo depois com a retomada dos mouros). Já depois, mas no reinado de D. Sancho II, este terá entrado pelo Baixo Guadiana (no Gharb al Andaluz) tendo conquistado Ayamonte.
[2] Pode ter consistido afinal por não haver reforços a partir de Évora em auxílio de Lisboa e por troca de o Al-Andaluz não ser atacado. De facto, foi o Alcaide de Évora (Al Mundhir) que terá mandado chacinar o seu Senhor Ibn Qasî, que o substituiu também em Silves e fez dispersar os seus seguidores no Ribat da Arrifana, em Aljezur.
[3] Em boa hora assinalado, hoje e pela terceira vez, pelo Corpo Consular acreditado no Algarve em honra aos algarvios que tão bem têm acolhido as comunidades de cidadãos estrangeiros residentes que representam e os que nos visitam nesta atividade que assumimos como a indústria da Paz.
[4] Hino já temos aprovado pela AMAL (composição do Maestro Armando Mota e letra de José Carlos Barros). A bandeira regional, sugiro a que a história nos deixou, conhecida, com os 2 reis cristãos e os 2 mouros em respeito à cultura e identidade da terra, com as cores ocre que nos marcam.