A região do Algarve foi uma das que mais cresceu em população entre 2011 e 2023: +7,3%, o maior aumento entre todas as NUTS II do país. Em contrapartida, a resposta construtiva foi insuficiente — apenas 5,1% de novos fogos face ao stock de 2011, um valor próximo da média nacional, mas desajustado face à forte pressão demográfica e turística.


Este desfasamento teve consequências diretas nos preços da habitação, que dispararam. As rendas e valores de venda atingem hoje níveis incomportáveis para a maioria das famílias algarvias, pressionadas por um mercado dominado pelo investimento estrangeiro e por opções de investimento de portugueses com liquidez, pelo alojamento local e por segundas habitações. O mercado formal de arrendamento praticamente desapareceu nas zonas de maior pressão, como Loulé, Lagos, Albufeira e Tavira.

Mesmo com o aumento dos fogos por edifício (de 1,0 para 1,7) e a redução da área média por fogo (de 118 m² para 80 m²), a produção habitacional não acompanhou o ritmo da procura. A construção nova foi dominante, mas a reabilitação urbana perdeu expressão ao longo da década, limitando a regeneração dos centros históricos e a diversificação da oferta.

O resultado é um Algarve dual: um para o turismo e para os investidores do ramo imobiliário e outro para os residentes, com acesso cada vez mais limitado à habitação digna. A economia local, fortemente dependente de setores com baixos salários, agrava esta equação, bem como a perda de poder de compra, associada à inflação e ao custo de vida, empurra milhares de pessoas para a periferia, para o mercado informal ou para a saída da região.

E o papel dos decisores políticos? No Algarve, a resposta tem oscilado entre o discurso cheio de promessas para um amanhã distante para as famílias que precisam de soluções hoje e a inação perante o aparecimento e agravamento do problema. Os instrumentos de planeamento não têm acompanhado a realidade social e demográfica, até porque muitos deles estão teimosamente a aguardar a sua revisão. Os programas públicos de habitação surgem lentamente, sem escala ou coordenação regional, enquanto a lógica do mercado, tantas vezes promovida em nome do «desenvolvimento», ignora o direito fundamental à habitação, produzindo habitação para quem está no mercado, deixando de fora milhares de famílias que já não têm acesso a ele devido à sua insuficiência financeira. As autarquias precisam de planos ousados, realistas e cooperativos, que priorizem a construção acessível, a habitação para trabalhadores e a reabilitação habitacional com função social. O Governo deve assumir o Algarve como um laboratório de políticas habitacionais estruturantes.

Porque sem coragem e decisão política, o Algarve continuará a construir… mas não para quem dele precisa.

Carlos Manso é Economista e Membro da Direção Nacional da Ordem dos Economistas

Crónica publicada em:
REVISTA ALGARVE INFORMATIVO #482 by Daniel Pina - Issuu

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