A emergência climática, a escassez de recursos e a crescente consciencialização dos consumidores estão a transformar o turismo. Já não basta ser um destino bonito — é preciso ser um destino responsável. Nesse contexto, as entidades públicas com responsabilidade sobre territórios turísticos têm um papel estratégico na transição para modelos de desenvolvimento baseados na economia circular.
A lógica da economia circular — reduzir, reutilizar, reciclar — é particularmente relevante em destinos turísticos onde a pressão sobre os ecossistemas naturais se intensifica em ciclos sazonais. Trata-se de territórios com exigências específicas: elevado consumo de água, produção intensiva de resíduos, mobilidade crescente e elevados custos de manutenção de infraestruturas, por isso, adotar práticas circulares nestes territórios é, portanto, mais do que desejável — é necessário.
Várias experiências de gestão pública demonstram que é possível aplicar os princípios da circularidade de forma eficaz, desde que exista visão estratégica, investimento em inovação e capacidade de articulação com a comunidade local e os agentes económicos.
Uma das áreas mais críticas em territórios turísticos como a região do Algarve é a água. A implementação de sistemas de rega inteligente, com sensores meteorológicos e de humidade, permite ajustar automaticamente o fornecimento de água aos espaços verdes, reduzindo drasticamente o desperdício, assim como, a substituição de espécies vegetais por plantas autóctones ou de baixa necessidade hídrica, que aliem a poupança de recursos à valorização da biodiversidade local. Ao mesmo tempo, a modernização da rede de abastecimento com tecnologias de deteção de fugas contribui para a eficiência global, com benefícios económicos e ambientais no médio prazo.
A gestão dos resíduos orgânicos é outra frente essencial na circularidade, onde a recolha seletiva de biorresíduos em áreas residenciais e turísticas permite canalizar esses materiais para compostagem, reduzindo ou até mesmo eliminando a dependência de fertilizantes químicos e reduzindo emissões de gases com efeito de estufa. A criação de pequenas unidades de compostagem local — com aplicação direta do composto nos espaços públicos — pode representar uma oportunidade concreta para fechar o ciclo dos nutrientes dentro do próprio território, reduzindo a pegada ecológica e promovendo a autonomia ambiental.
A aposta na eficiência energética e na produção própria a partir de fontes renováveis tem vindo a ganhar expressão, com resultados visíveis em alguns projetos de reduzida escala regional. Edifícios públicos energeticamente otimizados, veículos elétricos nas frotas operacionais e sistemas de monitorização de consumo são hoje pilares de uma gestão mais sustentável, mesmo com o aumento das necessidades operacionais — por exemplo, em quilometragem percorrida — é possível reduzir a intensidade carbónica e as emissões totais, desde que se aposte em soluções tecnológicas adequadas.
Mais do que implementar boas práticas isoladas, estas estratégias só são eficazes quando integradas numa visão sistémica do território. Quando a entidade pública lidera com coerência e transparência, o impacto vai muito além das suas fronteiras operacionais, criando-se uma cultura de corresponsabilização entre residentes, operadores e players turísticos e visitantes, alicerçada numa evidência concreta e em resultados partilháveis.
A economia circular, quando aplicada com rigor, não é um custo adicional — é uma alavanca para valorizar o território, reforçar a sua competitividade e garantir a sua resiliência. Os destinos que adotam esta abordagem não só preservam os seus recursos naturais, como também se posicionam na vanguarda das novas preferências dos turistas, cada vez mais atentos às práticas sustentáveis, garantindo uma sustentabilidade do setor e da região no longo prazo.
Este modelo de gestão pode — e deve — ser aplicado pelas várias entidades públicas com responsabilidades em territórios turísticos, porque os recursos existem, a tecnologia está acessível, e o contexto político e social é favorável. Falta, muitas vezes, o passo estratégico: integrar a circularidade como eixo central da política pública territorial.
Os destinos turísticos do futuro não serão apenas aqueles que oferecem paisagens deslumbrantes, mas sim os que forem capazes de garantir um equilíbrio entre prosperidade económica, justiça ambiental e qualidade de vida. E essa transformação começa com a ação pública e com o contributo de todos os setores da sociedade, cuja adaptação aos novos desafios de sustentabilidade devem ser acelerados, podendo os investimentos associados serem financiados pela Taxa Turística. Pensem nisto.
Carlos Manso é Economista e Membro da Direção Nacional da Ordem dos Economistas
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Nota: Este artigo de opinião apenas reflete a opinião pessoal e técnica do Autor e não a opinião ou posição das entidades com quem colabora ou trabalha.