No virar do século XX, os Estados Unidos foram palco de um dos episódios mais paradigmáticos da história económica: a luta contra os monopólios industriais. A Standard Oil dominava mais de 90% do mercado do petróleo, controlando preços, acesso a transporte e esmagando a concorrência através de práticas agressivas.


O governo federal respondeu com o Sherman Antitrust Act (1890), que culminou em 1911 na divisão da Standard Oil em 34 empresas independentes. O objetivo era claro: impedir que um único conglomerado tivesse poder suficiente para distorcer os mercados, condicionando a inovação, a concorrência e, por arrasto, o crescimento económico.

Essa política de fragmentação industrial revelou-se visionária. Ao dispersar o poder económico, os Estados Unidos criaram as bases para um capitalismo mais dinâmico, assente na concorrência. A competição forçou as empresas a inovar, a investir em eficiência e a melhorar as condições oferecidas aos trabalhadores.

Importa sublinhar que o aumento do poder de compra e a valorização salarial que marcaram o século XX não resultaram apenas desta fragmentação: foram também fruto de uma forte sindicalização, de políticas públicas de redistribuição (como o New Deal) e da difusão do modelo «fordista» de produtividade. Em síntese: a intervenção do Estado visava não apenas a proteção do consumidor, mas também a defesa da vitalidade do próprio sistema capitalista.

Avançando um século, o cenário é radicalmente distinto. Vivemos num mundo onde as chamadas «Cinco Magníficas» — Apple, Microsoft, Alphabet (Google), Amazon e Nvidia (a que se junta muitas vezes a Meta, consoante a métrica) — concentram não apenas capital e quota de mercado, mas também o controlo sobre as infraestruturas críticas da economia digital. Ao contrário dos monopólios industriais do passado, que controlavam bens tangíveis como petróleo ou aço, estas empresas dominam hoje ativos intangíveis: dados, algoritmos, inteligência artificial e plataformas globais de intermediação.

O desafio atual é mais profundo do que no passado, porque a concentração atual não se limita a condicionar preços ou expulsar concorrentes, molda os comportamentos dos consumidores, influencia a circulação de informação e, em última instância, condiciona até a esfera política. A capacidade destas empresas em investir somas colossais em lobbying, em engenharia fiscal e em relações públicas faz com que os governos, em vez de lhes imporem restrições, frequentemente se vejam na posição de negociar ou até de depender delas — seja em contratos de defesa, em infraestruturas digitais ou em projetos estratégicos de transição energética e tecnológica.

Do ponto de vista macroeconómico, a diferença é clara, no início do século XX, a fragmentação dos monopólios ajudou a criar um ambiente onde os ganhos de produtividade foram amplamente partilhados com a classe trabalhadora, fortalecendo a classe média. Hoje, a concentração nas «Cinco Magníficas» gera enormes lucros acumulados e uma valorização bolsista sem precedentes, mas a redistribuição desses ganhos para o conjunto da sociedade é muito mais limitada.

O fosso entre capital e trabalho está a acentuar-se, já que, enquanto os acionistas destas empresas acumulam riqueza a um ritmo histórico, a maioria dos trabalhadores enfrenta estagnação salarial e precarização.

A história económica mostra-nos que o capitalismo só prospera de forma sustentável quando existe concorrência efetiva, sendo que excessiva concentração corrói os incentivos à inovação de longo prazo, cria barreiras de entrada intransponíveis e enfraquece a coesão social. A lição do passado — da Standard Oil à AT&T — é inequívoca: sempre que o poder económico ultrapassa os limites do equilíbrio democrático, o Estado deve intervir.

O grande desafio do nosso tempo é que os monopólios de hoje são globais, digitais e multifacetados, tornando mais difícil a sua regulação por um único Estado. O que está em causa já não é apenas a eficiência dos mercados, mas a autonomia política das democracias.

Sem uma resposta coordenada e internacional, corremos o risco de no presente século os governos responderem às grandes plataformas, em vez de as plataformas responderem aos governos.

Talvez esteja na hora de revisitarmos a coragem política do passado e de recuperar o espírito antitrust — adaptado ao mundo digital e globalizado — para assegurar que o crescimento económico não seja capturado por cinco gigantes, mas sim partilhado de forma mais ampla pela sociedade. Pensem nisto.

Carlos Manso é Economista e Membro da Direção Nacional da Ordem dos Economistas

Crónica publicada em:
REVISTA ALGARVE INFORMATIVO #497 by Daniel Pina - Issuu

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