No dia 24 de novembro, o Bairro de Emergência Social da Horta da Areia, em Faro, vai ser palco da apresentação do livro «A Participação Cívica em Portugal», publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos e da autoria do professor e investigador José Carlos Mota, que coordena o Laboratório de Planeamento de Políticas Públicas da Universidade de Aveiro. O especialista em participação cívica e ordenamento territorial integra esta ação com a Fundação Vítor Reis Morais (Centro Comunitário Horta da Areia) e com o projeto «MUROS: Imaginamos a Eurorregião Alentejo, Algarve e Andaluzia».

O objetivo é partilhar a informação real sobre os últimos 50 anos de participação cívica no nosso país, dando a conhecer quais os principais muros a essa participação, mas também as inúmeras e inovadoras pontes que ao longo do tempo têm conseguido ligar pessoas, espaços, entidades e realidades em prol de uma maior coesão social. “Trazer a apresentação do livro de José Carlos Mota a um espaço que está sempre à margem é contribuir com mais uma semente para uma inversão e para um investimento no caminho da coesão social. O estigma que afasta os cerca de 200 habitantes deste bairro dos lugares de debate tem de ser contornado com abordagens mais inclusivas”, entende a organização.

Recorde-se que no Bairro de Emergência Social da Horta da Areia vivem habitantes de baixos rendimentos, estando muitos em situação de pobreza extrema ou dependência de apoios sociais: famílias portuguesas ciganas, famílias portuguesas não ciganas e migrantes de países lusófonos como Cabo Verde e Guiné-Bissau. Assim, a partir das 10h, haverá uma visita ao Bairro de Emergência Social Horta da Areia com o intuito de mostrar a realidade destas cerca de 200 pessoas.

A partir das 14h terá, então, lugar a apresentação do livro de José Carlos Mota, que contará com a participação de várias pessoas. Desde logo o especialista em participação cidadã e presidente da Associação OFICINA, Nelson Dias, que dará a este nível uma visão sobre o Algarve; da ativista pelos direitos humanos da comunidade cigana e das mulheres, Vera Santos; do ativista e figura de referência para a comunidade cigana residente no acampamento do Cerro do Bruxo, David Martins, que tem lutado pelo realojamento da sua comunidade; e David Fernandes, Diretor Técnico do Centro Comunitário Horta da Areia, um equipamento social da Fundação Vítor Reis Morais que resulta de um projeto de luta contra a pobreza (1996-1998) e que tem como zona prioritária de intervenção o Bairro de Emergência Horta da Areia. A moderação estará a cargo de Susana Helena de Sousa, do «MUROS: Imaginamos a Eurorregião Alentejo, Algarve e Andaluzia», um projeto que se foca na Eurorregião Alentejo-Algarve-Andaluzia (Portugal + Espanha), com o objetivo de aprofundar o conhecimento desse território entre a sociedade civil, reforçar identidade, cidadania participativa, justiça social, desenvolvimento económico sustentável, inclusão e cooperação transfronteiriça.

O livro «A Participação Cívica em Portugal», editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, tem como principal tese a ideia de que não existe um desinteresse ou uma apatia cívica estrutural em Portugal. Pelo contrário: quando as causas fazem sentido, os convites são sinceros e se vislumbram expectativas de mudança, as pessoas mobilizam-se e participam. Acontece que a participação não está ao alcance de todos. As vidas profissionais e familiares difíceis, sofridas e precárias, constituem um enorme obstáculo ao envolvimento cívico. Os temas, os convites e os métodos nem sempre são adequados aos diferentes grupos da sociedade. A desconfiança generalizada e certos estilos de poder também não ajudam. Os desafios sociodemográficos, económicos, climáticos e políticos que temos pela frente são gigantescos, num quadro complexo em que o regime democrático revela dificuldades em responder.

A democracia participativa surge como um aliado importante – não resolve tudo, mas pode proteger, robustecer e inspirar. O ciclo de conversas «Portugal não é um país sem nós», iniciado com o lançamento do livro no passado dia 1 de outubro em Lisboa e que se irá desenvolver em quatro cidades – Coimbra, Aveiro, Faro e Porto – pretende aprofundar esta reflexão e mobilizar vontades em torno de quatro linhas principais:

1 – Valorizar o capital de experiência participativa existente, reconhecendo que não podemos estar sempre a começar do zero. É fundamental divulgar e replicar as práticas acumuladas no poder local, no tecido associativo e cívico, e também no setor produtivo;

2 – Cuidar da esperança coletiva através do diálogo, da escuta ativa e de uma cultura de compromisso, materializada num conjunto de micro-utopias entendidas como “experiências coletivas e situadas, baseadas em interações sociais que oferecem vislumbres de formas de convivência alternativas no quotidiano”… “meios concretos de imaginar e prototipar modos de relacionamento e de vida diferentes”, como escreve Nicolas Bourriaud em Esthétique Relationnelle;

3 – Criar redes colaborativas mais eficazes que juntem cidadãos e organizações com o mesmo propósito, articulando iniciativas dispersas e voluntaristas que, embora valiosas, nem sempre alcançam a visibilidade e o impacto transformador que merecem.

4 – Instituir mecanismos financeiros de incentivo à participação cívica, que apoiem a capacitação, a mediação, a facilitação e a experimentação, valorizando o território — a cidade, o bairro e o espaço público — como verdadeiros laboratórios da democracia.