Em 2023 escrevi que envelhecer em Portugal era uma «chatice», mas que a alternativa era ainda pior. Era não chegar a essa fase da vida. Dois anos depois, os números confirmam o que então se temia e era previsível, pouco mudou, e em alguns indicadores até piorámos.
Segundo os dados mais recentes, um em cada cinco idosos portugueses vive em risco de pobreza, sendo que a taxa de pobreza para quem tem 65 ou mais anos subiu para 21,1%, apesar da melhoria geral dos indicadores sociais. A inflação recente tornou especialmente vulneráveis as pensões mais baixas, incapazes de acompanhar o custo real de vida.
É a continuação de um problema estrutural, onde décadas de trabalho traduzem-se, demasiadas vezes, em pensões mínimas; existindo uma dependência de transferências sociais quase total; e onde a oferta de habitação sénior, lares públicos e serviços domiciliários continua muito aquém das necessidades.
O país envelhece depressa, mas continua a responder devagar. Se em 2023 alertava para a «tempestade demográfica», uma pirâmide etária invertida e um sistema social sem preparação adequada, hoje confirma-se que continuamos sem uma estratégia nacional de envelhecimento que vá além de aumentos incrementais nas pensões e alguns projetos locais pontuais de resposta às necessidades crescentes. Não me levam a mal, estes são importantes, mas insuficientes perante uma realidade marcada por isolamento, habitação cara e falta de serviços essenciais para quem depende de apoio.
Para que Portugal deixe de ser um país onde a velhice é sinónimo de precariedade, é necessário muito mais do que pensões atualizadas pela inflação.
É preciso colocar a pensão mínima acima do limiar de pobreza, com indexação realista ao custo de vida; expandir a rede pública e social de lares e habitação sénior, garantindo preços acessíveis onde a habitação colaborativa deve ser implementada com urgência; é fundamental a criação de uma estratégia nacional de cuidados domiciliários, integrando saúde, assistência social, transportes e apoio à dependência; temos que promover o envelhecimento ativo e inclusão social, combatendo a solidão que agrava a pobreza; e investir numa política demográfica duradoura, que reduza a pressão sobre o sistema e reforce a solidariedade intergeracional.
A alternativa é continuarmos a olhar para os dados com surpresa, quando deveríamos olhar para eles com responsabilidade e capacidade de decisão e planeamento. A pobreza na velhice não é inevitável, mas antes uma consequência de escolhas políticas e prioridades sociais.
Envelhecer continuará a ser uma chatice, mas não tem de ser uma condenação. O país tem de decidir se quer, finalmente, ser também para velhos, mas para velhos que possam viver com dignidade. Pensem nisto.
Carlos Manso é Economista e Membro da Direção Nacional da Ordem dos Economistas
Crónica publicada em:
REVISTA ALGARVE INFORMATIVO #506 by Daniel Pina - Issuu
Nota: Este artigo de opinião apenas reflete a opinião pessoal e técnica do Autor e não a opinião ou posição das entidades com quem colabora ou trabalha.
Nota: Este artigo de opinião apenas reflete a opinião pessoal e técnica do Autor e não a opinião ou posição das entidades com quem colabora ou trabalha.
