A chegar ao final de mais um ano, assalta-nos um sentimento de frustração, resignação até, pelo que foram mais 12 meses de arrastamento de velhos problemas na região e no país. Pode parecer algo dramático e, porventura, exagerado, mas olhando em retrospectiva para 2025, é francamente confrangedor a inércia governativa face aos pequenos e grandes desafios da actualidade.

Pressão costeira

Após tudo o que já se disse e escreveu acerca de ordenamento do território e da necessidade em gerir meticulosamente a orla costeira, é com perplexidade que somos confrontados com a recente decisão da Câmara Municipal de Silves em autorizar (mais) um empreendimento turístico em Armação de Pera, junto à praia e em cima de arribas arenosas. Um projecto da década de 70, envolto num novelo de enredos e «estranhas» decisões governamentais, recebeu há semanas permissão municipal para instalar um hotel com 250 quartos, estacionamento e cave, piscinas interior e exterior, na única zona costeira daquela vila onde ainda havia umas réstias de falésias. Escusado dizer que este projecto, sob a famosa chancela dos «direitos adquiridos», indo contra todos os princípios de boa gestão territorial, obteve os devidos pareceres favoráveis para a sua implantação.

Casas amovíveis

Sobre isto, já muita tinta correu e os resultados estão à vista. Milhares de casas amovíveis, cabanas e contentores existem instalados em zonas rurais e de sensibilidade ecológica, sem qualquer controlo ou licenciamento. Há casos escandalosamente gritantes e outros sensíveis do ponto de vista social. Mas nada acontece e como tal continuam a proliferar. As denúncias avolumam-se, mas caem no esquecimento e na inoperância das instituições. A situação é bastante grave e está prestes a chegar a um ponto de não retorno – se é que já não chegou –, com consequências imprevisíveis, incluindo de segurança pública. Basta lembrar o incêndio ocorrido este ano no Barão de S. João, em Lagos, no qual arderam dezenas de «casas» dessa natureza.

Coesão territorial

Continuamos sem uma estratégia clara – nem uma vontade expressa, diga-se – em tentar colmatar os problemas de falta de coesão territorial. O interior continua a definhar, a despovoar-se e o litoral a encher e a massificar-se. Ao mesmo tempo que celebramos os dados do turismo no Algarve e os recordes de afluência à região, temos municípios onde as crianças têm de despender várias horas por dia em deslocações para chegar às escolas de concelhos vizinhos por não as terem no seu. Aljezur, Monchique, Vila do Bispo e Alcoutim são disso exemplos. Num terço do território português, sobretudo as regiões do interior, os jovens têm de se deslocar mais de 40 quilómetros para irem à escola – nalguns casos mais de 100 quilómetros. Como refere um recente estudo desenvolvido pelo jornal Expresso e o laboratório de dados Nova Cidade, da NOVA IMS, as dificuldades de acessibilidade a escolas em numerosos concelhos do país, especialmente do interior, está a ajudar a «matar» essas terras.

Conservação da Natureza

Este é um «velho» recorrente tema, cujos problemas associados irão continuar por muito tempo, ainda que não faltem os discursos de conveniência ou os acordos internacionais para os resolver. Continuamos sem uma decisão sobre a futura (?) reserva natural da Lagoa dos Salgados. As áreas protegidas continuam desprotegidas e a gestão dos espaços naturais é uma miragem. Os atropelos são constantes e pouco se consegue mudar. Mas temos, por outro lado, uma estratégia nacional, planos de co-gestão ou compromissos europeus assumidos com metas especificas a atingir até 2030...

Tudo isto é, no mínimo, paradoxal. Ao mesmo tempo a que assistimos ao arrastar destas e outras situações, somos regularmente informados e avisados por especialistas e estudos técnicos que apontam caminhos completamente diferentes. O recentemente publicado «Relatório do Estado das Regiões e dos Municípios», produzido pelo Comité das Regiões Europeu (CR), identifica como uma das suas principais conclusões a necessidade em que as cidades e as regiões façam investimentos de larga escala na adaptação climática, especialmente, em soluções baseadas na natureza. Também ali se exigem políticas específicas para manter serviços e oportunidades locais nos territórios rurais, como forma de contrariar os fortes declínios populacionais sentidos e criar alguma esperança de desenvolvimento para os mesmos. Ora, nada mais longe da realidade em que vivemos.

E assim passam os anos, sem uma perspectiva de mudança no horizonte. Mas a esperança não morre. Estamos numa época fértil para esse sentimento e há que o preservar. Posto isto, é com sinceros votos de boas festas que me despeço e que renovemos a esperança para um 2026 mais sustentável e, já agora, mais pacífico e harmonioso.

João Ministro é empresário e engenheiro do ambiente

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